Estavas sentada
na pastelaria
ao lado direito
de quem entra
pediste um descafeínado
bebias o café sem açúcar
fitavas na grande vidraça
o tráfego intenso
da rua lá fora
as folhas das amoreiras
coavam e deixavam
com nervuras
o sol primaveril
no final dos pensamentos
o gradeamento verde
do jardim zoológico
como tu gostavas de bichos
tinhas um olhar
vagamente sonhador
um eco mais ou menos
longínquo
adquiriu um brilho húmido
no teu olhar
tiveste um esgar
ao provar o café
já tinha arrefecido
detestavas bebê-lo frio
e assim perder a grata
sensação de pegar
a chávena quente
nas duas mãos
e sonhar
que poderias ele
regressar
repentinamente
entrar por ali a dentro
como dantes
pediste para pagar
e fugiste dali
subitamente nua
frágil e de porcelana
faltou-te a desenvoltura
ao passares
por ele
e a clarividência
de o vislumbrar
surpreendentemente
sentado na obscuridade
que não tinha passado
nem futuro.
Lisboa, 8 de Abril de 2014
Carlos Vieira
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