Olho o aqueduto,
chove,
cortinas de água
descem dos arcos.
Um toxicodependente abriga-se
junto a um pilar
e admira o azulejo.
Um fogareiro passa afogueado,
vai admirar o Tejo
a olhar o taxímetro.
A mata do Monsanto
tem neste preciso momento
milhões de pérolas de água
penduradas nos pinheiros mansos.
Os homens também mansos
e os cães vacinados contra a raiva
esperam que o mau tempo passe
e dizem os analistas e os psicólogos
que está quase a saltar-lhe a tampa.
A meados desta semana
vamos atingir o pico da gripe.
Vacinem-se, vacinem-se,
preparem-se para o pior.
Percorro o eixo Norte-Sul
com um pouco de sorte e de destreza,
hei-de ver o golfinho no zoo
a fazer um triplo salto,
enquanto outros
no Japão na baía
da cidade de Taiji
fazem das tripas coração.
E depois nas hortas sociais,
há gente de cócoras
a adubar as plantas,
que não aguentam mais.
Nesta região
já me esquecia que temos a Bolsa,
nunca nos devemos esquecer da bolsa
de jogar,
hoje não se pode vender
que os títulos estão em terreno negativo
Oh! Os seguros do Nasdaq!
Ali a dois passos,
na Praça de Espanha um velhote andrajoso
vende bolacha americana
e pensos rápidos
num sinal vermelho.
Tudo, negócios de oportunidade.
E o Borda-de-água!
Oh! Quase me esquecia
que há anos faz as previsões para o país
que nunca fomos,
num esforço sério
em que as sementes vingam.
Olho o aqueduto
e sinto séculos de sede
de cidade sitiada,
de água desperdiçada,
vejo tudo isto
desta minha água-furtada
eu e o meu gato
o " Zé do Telhado",
que como todos os gatos
não gosta de água.
Lisboa, 22 de Janeiro de 2014
Carlos Vieira