Há dias em que dentro de nós há sementes de fúria
vamos pela noite fora e faíscam lâminas de charrua
a esventrar a terra do eterno descanso
há dias em que mordemos de raiva a côdea da terra
e irrompendo pelos caminhos das trevas
somos a incansável perícia do trigo
há dias de tropeçar nos torrões a agonizar nas planícies
do estrangulado desespero de raízes
de pressentir a minha sombra debaixo da terra
há dias que recordo o cheiro intenso depois das chuvas
e do vapor que se libertava das entranhas da terra
agora só a memória me deixa respirar
há dias em que dormimos abraçados eu e a terra
há dias que parecem noites em que não durmo
depois vou acordar já morto nos teus braços
Lisboa, 14 de Fevereiro de 2012
“Who am I” pintura de Maximilian Toth