Sopram forte os primeiros ventos
de Outono e ninguém estava à espera. No largo do antigo palacete apodrece o
luar e oiço gritos - há uns tempos que oiço gritos cada vez mais perto - aos
quais se sucede o silêncio e reconheci os Nocturnos de Chopin.
Abruptamente, aqueles foram
interrompidos por um estrondo. Uma árvore que viu cederem definitivamente as
suas raízes já podres ou um homem esmagado pela dimensão do seu sonho de viagem,
tudo isto me assaltou e é recorrente.
Não está fora das cogitações daqueles
menos habituados ao mundo das árvores, a hipótese meramente académica da queda,
sempre desamparada, de um fruto maduro. Muito embora, não se tivéssemos apercebido
de qualquer rumor impaciente de animais que lhe deveria seguir.
Ali, afastado da cena principal,
envolto em fumo, após compilação de gestos e palavras murmurados, distingui o
espectro de um homem que vendia castanhas.
Cedi à tentação, de sujar as
mãos, de tinta de jornal e de cinza e pedi uma dúzia, enquanto aquele calor
sólido me descia às entranhas, podia sucumbir sobre o restolhar inquieto dos
tempos e das folhas dos castanheiros e voltar a ouvir, o tal piano solitário.
Lisboa, 29 de Setembro de 2012
Carlos Vieira