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sábado, 25 de janeiro de 2014

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Tem cara de perder. Esta semana
voltou a não levar preservativos
e nunca mais comprou comida para o cão.
Se calhar divorciaram-se, e ficou ela
com o bicho. Só não percebo como é que
ele sozinho consegue beber tanto leite.
Perdeu também um pouco da arrogância
com que habitualmente me passava
o visa. Mas devia ser bonito, em novo.


Manuel de Freitas
Isilda ou a Nudez dos Códigos de Barras
Black Sun Editores
2001

sábado, 18 de janeiro de 2014

BECHEROVKA





Norueguesa, alta, de um moreno
duvidoso que sorria muito.
Pedia-me insistentemente para não estar
triste como deveras estava.
E pagou-me, creio, o último copo,
antes de me perguntar "o que fazia".

Escrever, sobre a morte, não é
exactamente uma profissão.
Mas foi a resposta que lhe dei,
enquanto um guardanapo qualquer
abreviava, só para ela, a minha "obra".

Nunca saberei se percebeu a letra,
se comprou os livros, se chegou
a ouvir o que em péssimo francês
lhe tentei dizer nessa noite, a mais perdida.

Os versos são quase sempre isto: um modo
inaceitável de dizer que não tocámos o corpo
que esteve, por uma vez, tão próximo
de nós – e que nem um nome breve nos deixou.


A flor dos terramotosAverno, Lisboa, 2005.