Tocar
de ternura efémera
uma vida
irrelevante
o seu espanto
anónimo
sublinhar
as reentrâncias
o estertor subliminar
avivar-lhe
a ruga e disfarçar-lhe
a nódoa negra
no olhar límpido
acrescentar
a sombra subtil
quase imperceptível
meticulosamente
abrir um caminho
para o mar
e para a palavra
inaudível
e deixar
que o seu vagar
vá destruir
o baixo relevo
que na areia
tornou possível
esculpir
a preto e branco
o seu retrato
e que o mar e a palavra
possam temperar
a tenaz do calor
e que deixe o sal
sulcar a cicatriz
e lhe devolva a cor
e que a dor
que cura
seja a mesma
que lhe faz sobressair
a beleza
e que contra
o esquecimento
viva o rosto sossegado
da tristeza
e ainda que pautado
pelo cabelo
do desalinho
resista
esse antigo acto de amor
amortalhado
de cambraia e pergaminho.
Lisboa, 11 de Junho de 2016
Carlos Vieira