sábado, 19 de abril de 2014

Balada do desempregado

senta-se no chão
ali naquela rua do Poço do Bispo
esfrega bem os olhos
limpa a única lágrima
que lhe escapou
tem nas mãos um papel
esborratado
é para o fundo de desemprego
ainda tem coração
foi sempre um homem de coragem
de desafios
-compreendo, sim! é a crise!
a inexistência de encomendas
os produtos descontinuados
- obrigado pelas palavras!
- o sr. foi um empregado modelo!
só os cobardes é que desistem
não é surdo ou mudo
possui agora toda aquela rua 
e todas as outras da Nação
- compreendo, sim! 
as economias emergentes!
apesar de tudo pensas 
na falta de competividade 
aos cinquenta e cinco anos
tens casa para pagar e família
foste despedido e ainda sonhas
eis uma bela oportunidade 
para mudar de vida
para pensar no futuro
de poder conhecer outro país
é como se tivesses
agora chegado ao mundo 
- compreendes, sim! 
a bolha imobiliária!
o Lehman Brothers! 
a divída pública!
e ainda ter duas mãos
para esconder "as vergonhas"
senta-se no chão 
de uma rua do Poço do Bispo
e esfrega bem os olhos
à vergonha de não poder trabalhar
junta-se a culpa de não ter que comer
que belo serviço foi arranjar
neste ocaso da vida
tem de haver alternativa
à luz do comboio
ao fundo do túnel

Lisboa, 19 de Abril de 2014
Carlos Vieira

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