sala de espera
das urgências do hospital
5h da manhã uns com cara de caso
outros com caso
os doentes e os acompanhantes
aparentemente
não se distinguem
só com olho clínico
distingo os médicos
por carregarem ao pescoço
o poder de nos escutar
o coração
agora
o pessoal já não
o pessoal já não
anda todos de branco
mas ainda tem
aqueles gestos de anjos com sexo
o que me agrada
não chegou
nenhuma ambulância histérica
sobretudo com este frio
não dá jeito nenhum
estar doente ou ter acidentes
passou uma enfermeira
sorridente e com a segurança
de barco que atravessa todas as tormentas
os doentes não tem outro remédio
de que se lhe entregar
"Não, não estou eu que estou doente,
é a minha mulher!"
sempre tive
alguma admiração pelas macas
carrinhos de esferas onde se anda deitado
até que parti uma perna
e esfumou-se o sonho
em 5h de pesadelo
a 5 palmos do centro de gravidade
já devia ter o brevet
das urgências
inscrição, triagem, médicos estremunhados,
exames complementares de diagnóstico
sonos e sonhos perdidos
fico anestesiado
só do cheiro a medicamentos
e pela iluminação etérea
viajamos nos corredores estreitos
como dentro de nuvens cirroestratrus
e o céu já ali
deixei o hospital
e fica-me aquela sensação longínqua
dos rostos dos médicos,
dos quase médicos
dos paramédicos
a desvanecerem-se
"Está com outro ar!
Está com outro ar!"
eu que sofro de asma
e que sou apenas
o acompanhante
de um familiar
Lisboa, 24 de Janeiro de 2014
Carlos Vieira
Sem comentários:
Enviar um comentário