a ruela
de geometria variável
exembriagada
é um arremedo de artéria
sem misericórdia
sem estudos
esconsa e de luz dura
ali abundam
os biombos que escondem
a miséria
uma ternura de punhal
ao ritmo
de música pimba
a ruela
dos olhares libidinosos
e das mulheres da rua
de seios de silicone
generosos
assobiando
da ombreira da porta
em pinturas
de guerra seminuas
com nuances
em adolescentes
anoréxicas
tão cedo já velhas
de faca na liga
e facilidade em preservativos
a ruela
é de pequenos "dealers"
consumidores
traficando o panfleto
com produto de corte
no saguão
onde uma luz difusa
decompõe a agulha
a veia e o garrote
a tolerância
aos riscos e aos ácidos
e vamos experimentar
e foge que vem aí
a bófia
já não se pode estar
descansado
na Terra
a ruela
esse laboratório social
de frascos
de perfume barato
e desemprego
de longa duração
e sabores exóticos
de grafittis
e retortas e pipetas
de alcóolicos anónimos
e bisturis
improvisados
de velhotes
que se atiram das escadas
por não chegarem à janelas
nos bazares chineses
há bugigangas
e como são oportunas
estas estruturas e objectos
a funcionar
como redes informais
de suporte
ouve-se o tamarelar
de línguas cada vez menos
estranhas
na ruela
cada vez mais
cosmopolita
nome técnico para o caos
para a falta de raízes
e traficância de deuses
cada vez somos mais
poliglotas
uns falam em alhos
e outros em bugalhos
cada vez mais fluentes
e mais descartáveis
as ruelas
no fim de contas
apenas tem a ver com m2º
com decíbeis
com a potência do contador
e nada mais
gosto desta precisão/explicação
científica
tecnológica
desta gente
perfeitamente integrada
no seu meio cultural
e que para o mundo
é apenas um número marginal
Lisboa, 25 de Janeiro de 2914
Carlos Vieira
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