as palavras erguem-se
pesadas
sobre o ruído mecânico
das ruas
reconheço-as
pela acústica vibrante
das suas asas
pousadas nos candeeiros
à espera da luz,
nos sinais de trânsito
de mão estendida
nos semáforos,
palavras bichos
que sobem pelas árvores
pelas varandas
e pelas esplanadas,
apertadas
em escadas antigas
mal iluminadas,
cuspidas
com sangue
e vómito e imprecações
mal amadas,
curtas
atingidas por punhos
e bofetadas
em murmúrios de misérias
envergonhadas
ou em gritos violentos
de amores reencontrados,
suburbanas
atiradas
como quem rosna
e roubadas
à tristeza,
palavras de alivío
de desencanto,
libertas
das garras do silêncio,
esquecidas
em grutas
pedras preciosas
nunca usadas,
palavras de usar
e deitar fora
fora de horas,
penduradas
de andaime em andaime,
em roldanas
retiradas de poços,
do eco dos claustros,
palavras arrancadas
de dentro de si próprio
para serem flores
ensanguentadas,
provas de um amor
que não se soube dizer
presas à garganta,
aves
que lhe devoram
o peito,
palavras gravadas
a ferro e fogo,
nos corredores do tempo
de silêncio
da descoberta,
incineradas,
cujas cinzas
não conheceram ventos,
caladas para lá
dos portões da vergonha,
onde o trabalho liberta.
Lisboa, 27 de Janeiro de 2014
Carlos Vieira
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