domingo, 7 de outubro de 2012

Sonhos em 3D pela alameda


 

 

Filigranas de Outono, a bordejar o céu cinzento desta Alameda, de um tempo de tubos de

escape.

Nuvens de folhas, em remoinho perseguem-no, enquanto não o revestirem, não vão

descansar, enquanto não o cercarem no beco, como a fome de uma pequena matilha de cães

abandonados.

Aceitaria fazer de morto ou fingir de árvore derrubada, a história da intervenção dos bichos

mais adiante é que ainda lhe faz cócegas.

De resto, aquela humidade da terra que sente nas costas, pareceu-lhe o início de uma nova

vida ou talvez do crescimento das asas, sentiu-se por isso, naquilo que deveria ser a sua queda,

mais perto do céu.

Sentou-se num daqueles bancos clássico de tábuas de madeira pintadas de verde, a resistir ao

frio que anoitece nos seus pensamentos.

Divaga no xadrez de luzes dos prédios em frente. Vai reconstituindo os afazeres e conflitos

domésticos, daqueles vizinhos também eles de passagem, com tudo tão arrumado.

O bispo branco no seu movimento traiçoeiro e oblíquo comeu o cavalo, enquanto uma família

numerosa prosseguia, no seu frugal jantar.

Um casal de namorados que se preparava para a inocência desastrada do primeiro beijo

encostado a um tronco de uma amoreira, foi devorado pela máquina de lavar, da

marquise do 1.º andar, ali sobre a minha direita.

O mundo está estranho em Outubro, a Alameda está quase nua e quase morta, estranho

enigma é aquela nudez primordial.

Lá vamos, muito cegamente, a caminho do cadafalso, do caos, de olhos vendados, tropeçamos

na desconhecida pureza da neve, confundimos a alergia com o desabrochar das flores e

deixaremos de saber distinguir o perfume e as cores da fruta madura.

Nós os citadinos passamos a correr pela vida, porque estaremos sempre atrasados e quando

chegarmos ao destino, vamos descobrir que já é Verão e desistir de todas as outras

estações.

De qualquer forma, o aumento do preço dos bilhetes, não nos permite que nós tenhamos

outra dimensão nos sonho.

 

Lisboa, 7 de Outubro de 2012

Carlos Vieira

 

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