sábado, 13 de outubro de 2012

A preparação física está a dar cabo de mim...


A preparação física está a dar cabo de mim. Hoje levei a minha filha à ginástica, esperei por ela uma hora e meia, os atletas das mais diversas modalidades passavam por mim, naquela pose de deuses acabados de sair das nuvens ou esbaforidos, muito perto da eternidade, serenos e elegantes como se a dimensão dos problemas da vida não lhe oferecesse qualquer receio e se por caso paravam, era para fazerem um compasso de espera, se concentrarem e definirem qual a linha de ataque mais favorável.

Eu quase deitado no sofá, pousava o olhar de mãe em mãe, de pai em pai, procurando-lhe o calcanhar de Aquiles e definindo-lhe o perfil deformado, liam os seus livros indiferentes à desenvoltura do meu olhar, pouco consentâneo com a proeminência do meu abdómen e preguiça do meu refastelamento, navegavam muito distantes e compenetradas, nesses longínquas latitudes que as últimas gerações de iPads e smartphones permitiam, à distância de um clique.

Depois olhei para a rua, de bicicleta ou em corrida inúmeras pessoas faziam o seu jogging matinal, de fim-de-semana, pouco a pouco fui ficando enjoado, o mundo era o estádio universitário que andava às voltas, na minha cabeça.

Eu estava cansado, muito cansado, as pessoas entraram para dentro de mim de ténis, faziam flexões, alongamentos, cambalhotas, um suor frio escorria, abundantemente, pelo meu corpo, sempre tive este tipo de excreções, muito à flor da pele.

Umas vinham para perder peso, outras por causa do coração, outras para ganhar músculo, para manterem a forma, ninguém queria morrer cedo, iriam vender cara a derrota, eu olhava perplexo para aquela gente tão boa, tão sã, tão regurgitante de vida.

Procurei acompanhá-los e logo tropecei, incapaz de compreender a gramática de todo aquele frenético movimento, sobretudo, inepto para encontrar o sincronismo, entre a velocidade feérica do estádio dos sonhos que na minha mente persigo e esta disponibilidade física e mental dos indivíduos a que a vida não pede qualquer urgência.

Despertei do círculo fechado desta reflexão, quando a voz suave da minha filha mais nova, me esclareceu todas as dúvidas, imbuída de uma inabalável veemência, no que respeita à esforçada grandeza, de alcançar ao ar livre, o peso pluma, a liberdade dos próximos quarenta e cinco minutos. Esforço derradeiro, de forma a convencer os que me rodeiam, de que tenho mais olhos que barriga.

- Vamos pai, hoje prometeste que irias correr comigo!

 

Lisboa,13 de Outubro de 2012

 

Carlos Vieira

 

 

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