terça-feira, 21 de outubro de 2014

Vigilância I



Uma luz 
acendeu-se
no 2.° Dt.º
do n.º 48
subiu o estore
delicadamente
alguém
abriu a janela 
acendeu
um cigarro
fumou-o
pausadamente
ageitou
o cabelo
que esvoaçava
e abotou a blusa
insinuante
percebia-se
uma mulher
de meia idade
um sorriso 
desprendeu-se
dos lábios
o seu olhar 
estremeceu
em direção
a um vulto
que denunciou
agachado 
nuns arbustos
ali em frente
uma respiração 
ofegante
não foi perceptível
se era lágrima
ou pingo de chuva
que resvalava
pela sua face
se aquela
auréola 
provinha 
de alegria interior
ou de resquícos de lua
que nuvem
escondera.
Em face daquele
absurdo
confirma-se
a suspeita
hoje já
não se ama
mais assim
por sinais
de peças de roupa
no estendal
e o homem
que é homem
não finge
de flor no jardim.

Lisboa, 20 de Outubro de 2014
Carlos Vieira

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