quinta-feira, 12 de junho de 2014

Viagem em círculo

Viagem em círculo

Estou um pouco 
enjoado
de pontes e de canais
ou talvez 
a cervejaholandesa
tivesse sido 
demais.

Deixo-me ir 
ao sabor da maré 
e da espuma
da manobra tranquila
sigo o labirinto secular
do tijolo 
e dos barcos-casa
na bruma.

Caio na armadilha 
da eloquência 
das janelas 
e das escotilhas
subitamente 
estou acima 
da linha de água
do seu murmúrio
entro
no roçagar
doméstico
da sala de jantar.

Ao mesmo tempo
pareceu-me ouvir
na penumbra
de um recanto
o resfolgar
do voo curto 
da navalha
que antecede
o grito lancinante.

Quarteirões à frente
algures acendem-se
janelas de oportunidades
montras de espanto 
a nu
de um lado e doutro
abismos de alma
hinos ao impudor
dos sentimentos.

Em caleidoscópio
precedendo o rodopiar
manso das bicicletas
com suas as cintilações 
de alumínio
interpreto a subtileza
das imagens 
de desencontros
o chapinhar nas margens 
da solidão 
no desencanto.

Abandonados 
nas esplanadas
e por becos esconsos
simulacros 
de um leilão do amor
envolto de perfume 
e especiarias
e do fumo 
dos cachimbos de água.

Viagens 
em círculo viciado
ou viciante 
pelos canais
pelas ruas estreitas
onde se cruzam 
e se entendem
dialectos exóticos
do outro mundo
na noite 
de Amesterdão.

Amesterdão, 11 de Junho de 2014

Carlos Vieira

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