os teus dedos
a tiritar
são afluentes do silêncio
corvos pousados algures
num antigo nevoeiro
e depois do adeus
sem olhar para trás
as palavras que te
conhecia
abandonam-me uma a uma
perdi-te
agora resta-me este exílio
de colher as flores e os frutos
sem partilha
sem te encontrar à esquina
sem largos de coração aberto
e mãos de sol e a luz dos sorriso
iluminando o teu rosto
sem a alegria breve
dos teus gestos mansos
sem fronteiras
agora
não tenho pressa
ou essa pátria de chegar a casa
de sentar à mesa
e de te olhar
depois da eloquência do pão
agora perdi o fio da história
sou atónito
perante o silêncio das ruas
em que te conheciam pelo nome
passas friamente pela berma do olhar
temes o confronto
escondeste-te de todas as tempestades
tu que sempre foste temerária
e colhias as estrelas
e fazias delas os beijos
que conheciam os céus e os abismos
sou apátrida
neste novo país em que vivo
sem ti
de onde não saímos
desta vergonha
do que somos
em viagem
agora
somos desta imensa tristeza
que acorre num só olhar
ancorado em tanto desalento e medo
de tanta ruína e pedra solta no caminho
de tanta separação
e não querer chegar
eis-nos aqui mais sós
e menos independentes.
Lisboa, 7 de Junho de 2012
Carlos Vieira
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