Suas mãos frágeis
são o último esplendor do verão
pousadas nas minhas
pequenos pardais delicados
sem ritmo
desafinados
ou quedam-se na cansada
ternura dos jogos de luz
que se lhe escapa entre dedos
e a fractura.
Seus olhos tristes
a desaprender a vida
pássaros mínimos
e sempre tão brilhantes
que foram álacres
e agora tão mais ávidos
da fractura
dos ramos e das flores
e da fruta madura
Tua boca de ave
tão pequena
tão poupada de todos os beijos
tão sofrida
das intempéries dos grandes voos
e de todas as mortes
tão só das poucas palavras
de nomear
as dádivas luminosas
que irrompiam das suas mãos
curando tantas dores
e tantas fracturas
o mesmo milagre
do pão e das rosas
Na geografia do teu rosto
aqui tão perto do meu
aqui estás neste ângulo
de há tantos anos esquecido
exactamente
180º à minha frente
enquanto pela primeira vez
te dou desajeitadamente
uma colher de sopa
e nela avalio
o gesso das fracturas
de todas as mães.
Fico à tua espera
daquele teu golpe de asa
em forma de sorriso
durante todo o tempo da visita
pela primeira vez ali estás
sortilégio de carne e osso
entre lençóis brancos
minha flor renascida
minha mãe mais dura
heróica e triste
que a mais esta fractura
da vida resiste
no meio do meu poema
levanta-se e anda.
Leiria, 18 de Agosto de 2012
Carlos Vieira
Chagall – “Flight”
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