corre
um homem nu
no meio da avenida
das buzinas estridentes
todos os homens e mulheres
correm nus
o polícia acorre diligente
a mulher de meia idade sorri
consumida pelo pudor
outra mulher idosa afasta-se
como se tivesse visto o fantasma
de si própria
nas janelas dos escritórios
estavam dependurados os rostos
de um anónimo encantamento
que faltava nas colunas do deve e haver
nas lojas de pronto-a-vestir
houve um intervalo no toque dos tecidos
e os clientes vestiram-se rapidamente
ninguém o reconheceu
um homem como Deus o deitou ao mundo
é muito mais difícil de reconhecer
há muito mais probabilidade de um homem nu
poder ser louco, foragido, exibicionista, libertário
nunca seremos nós mesmo
ele lá prosseguia na caricata dança das “partes”
e mantinha uma distância razoável
do esbaforido homem da lei
até que por fim o homem
se escapuliu por a ruela
o polícia desistiu
e à avenida
regressou a crucificada normalidade
e ao esquecimento
aquela nudez marginal
Lisboa, 7 de Julho de 2012
Carlos Vieira
“Homem Vitruviano” datado por volta de 1490 de Leonardo Da
Vinci (1452-1519)
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