Poema com magnólias
Oiço-a respirar
com dificuldade,
agitada
das coisas
por dizer,
entaladas
na garganta
-tu que sempre foste
tão clara –
por dentro de mim
é directa a proporção,
a surpresa
com que aumenta
o meu batimento
cardíaco
e um estremecimento
perturbador,
uma calada
preocupação.
Olho pela janela
lá fora
e vou pela tua mão,
pela vereda
de um outro tempo,
em que nos agachámos
a observar
com a contida
respiração
uma raposa
de ficção,
atenta ao volume
do restolhar
do coelho,
nas folhas secas
do bosque ali perto,
pelo princípio
do outono.
De qualquer forma,
pressente-se
o crepitar
e a ténue chama
de vidas,
presas por um fio,
por um momento
olho para ti,
nos teus olhos
pequeninos
focados no firmamento
e eis que desce
uma lágrima,
a última gota
que me afoga.
Tudo isto
devia ser apenas
uma gripe,
fruta da época
e não é essa história
da extensa lesão
no parietal direito,
voltaste
a jogar às escondidas
sem ter idade
para isso,
neste tempo
tão propício
ao desencontro.
Não minha amiga,
assim não vale
ires esconderes-te
no hospital
e só te poder encontrar
à hora da visita.
Lembras-te
que a brisa denunciou
a raposa
e que ainda
vem aí a Primavera
que temos
muitos passeios
por dar
pela alameda
das magnólias
que neste poema
plantei para ti.
Lisboa, 18 de Fevereiro de 2015
Carlos Vieira
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