Constrangimentos
Áustero
lúgubre país
do medo
entre dentes
desprendem-se
palavras desesperadas
sob vigilância
Atrevimentos medíocres
simulacros
de efémera coragem
um vulto certamente
delinquente
percorre a noite
em zig-zag
acossado
Habituamos-nos
aos murmúrios
de fome
a pequenos crimes
arrastando a vergonha
e à inevitabilidade
dos ossos do silêncio
e do ofício
Palavras desfeitas
palavras armadilha
sem rasgo
sem tempo
submersas no musgo
de um futuro luminoso
Vestígios de escaramuças
de um mercado de odores
agridoce
pestilência dos campos da batalha
por uma vida
pelo seu regresso
pela paciência na antecâmara
dos frutos maduros
Incansável dissidência
véspera de um rio
acredito a partir daqui
deste esgoto a céu aberto
depois assisto
à triste precariedade
de néon azul
de uma operação stop
ainda bem
que está tudo em ordem
Na apertada curva
de um percurso desconhecido
um nó na garganta
e a encenada morte
inglória e por acidente
são irrelevantes
os danos colaterais
Nos ombros desnudos
que se afastam
a memória vencida
longínqua
de um toque do veludo
afogado em dor de corno
deve aceitar
com naturalidade
o fim de uma relação
Descrevo na insónia
a ave que pousa suavemente
nas ruínas de um país
anunciando
esse provável
declínio do amor
Lisboa, 4 de Junho de 2013
Carlos Vieira
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