Um prolongado silêncio aflito
na véspera de água
um grito
O lume brando perpendicular
ao voo da pedra
e do pardal
Os reflexos de um peixe-gato
são um piano de luz
e de espinhas
Naquele lugar inóspito a língua morta
no ventre do tempo
é apenas erva
impunha a lâmina curva
e a triste lâmpada
O instinto de sobrevivência
leva ao beco sem saída
o animal ferido
Lançados ao mar os restos mortais
só o secreto rumor da seiva
coincide no lamento
Uma vez a partir do suave declive
soltou-se um fruto seco
e o gesto subtil
A história do esplendor das manhãs
feita de fogo e flor de sal
e estampidos
A laranja que de manhã era de prata
o sol que lhe sorri nos lábios
após a palavra amarga
Uma porta que se abre arrastando-se
teu nome na minha boca
a quietude da maçã
Chega a noite com o mistério da tinta
teu perfume é sombra de vento
nos ombros nus.
Lisboa, 10 de Dezembro de 2012
Carlos Vieira