Naquele preciso momento
na perplexidade
na indiferença
do golpe
não era ele que estava ali
quando a lâmina encetou
o seu vibrante caminho
sem retorno
e aflorou o coração
após penetrar pela floresta
do interstício vertebral
era impossível ser ele
quando na boca soçobrou
a derradeira palavra
exclamando a solidão
e o olhar se despediu da Terra
fitando-o atónito
perante a perfídia
não poderia ser ele
que estava para lá do tempo
antes das casas e do código postal
dos números de polícia
dos cidadãos e dos deuses
desses de todos os dias
que cantam e amam
uns por cima dos outros
ou lado a lado
ele era agora
aquela arma branca
discurso e flor ensanguentada
sobre a mesa
e inútil de novo
ele era agora
as amáveis ruínas
que sobram na luz da tarde
esse puro punhal
que algures
nos torna no mínimo cúmplices
nessa morte fulminante e sem motivo
de abreviar o mundo
aos frágeis heróis
pelos cobardes do dia a dia
Lisboa, 18 de Novembro de 2012
Carlos Vieira