A preparação física está a dar
cabo de mim. Hoje levei a minha filha à ginástica, esperei por ela uma hora e meia,
os atletas das mais diversas modalidades passavam por mim, naquela pose de
deuses acabados de sair das nuvens ou esbaforidos, muito perto da eternidade,
serenos e elegantes como se a dimensão dos problemas da vida não lhe oferecesse
qualquer receio e se por caso paravam, era para fazerem um compasso de espera, se
concentrarem e definirem qual a linha de ataque mais favorável.
Eu quase deitado no sofá, pousava
o olhar de mãe em mãe, de pai em pai, procurando-lhe o calcanhar de Aquiles e
definindo-lhe o perfil deformado, liam os seus livros indiferentes à
desenvoltura do meu olhar, pouco consentâneo com a proeminência do meu abdómen e
preguiça do meu refastelamento, navegavam muito distantes e compenetradas, nesses
longínquas latitudes que as últimas gerações de iPads e smartphones permitiam,
à distância de um clique.
Depois olhei para a rua, de bicicleta
ou em corrida inúmeras pessoas faziam o seu jogging
matinal, de fim-de-semana, pouco a pouco fui ficando enjoado, o mundo era o
estádio universitário que andava às voltas, na minha cabeça.
Eu estava cansado, muito cansado,
as pessoas entraram para dentro de mim de ténis, faziam flexões, alongamentos, cambalhotas,
um suor frio escorria, abundantemente, pelo meu corpo, sempre tive este tipo de
excreções, muito à flor da pele.
Umas vinham para perder peso, outras
por causa do coração, outras para ganhar músculo, para manterem a forma,
ninguém queria morrer cedo, iriam vender cara a derrota, eu olhava perplexo para
aquela gente tão boa, tão sã, tão regurgitante de vida.
Procurei acompanhá-los e logo tropecei,
incapaz de compreender a gramática de todo aquele frenético movimento,
sobretudo, inepto para encontrar o sincronismo, entre a velocidade feérica do
estádio dos sonhos que na minha mente persigo e esta disponibilidade física e mental
dos indivíduos a que a vida não pede qualquer urgência.
Despertei do círculo fechado
desta reflexão, quando a voz suave da minha filha mais nova, me esclareceu
todas as dúvidas, imbuída de uma inabalável veemência, no que respeita à esforçada
grandeza, de alcançar ao ar livre, o peso pluma, a liberdade dos próximos
quarenta e cinco minutos. Esforço derradeiro, de forma a convencer os que me rodeiam,
de que tenho mais olhos que barriga.
- Vamos pai, hoje prometeste que
irias correr comigo!
Lisboa,13 de Outubro de 2012
Carlos Vieira