segunda-feira, 10 de março de 2014
Em frente à minha janela...
Em frente
à minha janela
as aranhas teceram
em silêncio
uma enorme armadilha
de fios de luz
à volta
do pinheiro alpino
eu e os pássaros
ficámos reféns
daquela teia
e da enorme
sombra verde
eles entoam
à desgarrada
cantigas de protesto
eu escrevo as letras.
Lisboa, 10 de Março de 2014
Carlos Vieira
Três ovelhas...
três ovelhas com seus badalos
correm pela estrada de terra batida
eu vou pastando nesta relva do “wallpaper”
Lisboa, 10 de Fevereiro de 2014
Carlos Vieira
correm pela estrada de terra batida
eu vou pastando nesta relva do “wallpaper”
Lisboa, 10 de Fevereiro de 2014
Carlos Vieira
domingo, 9 de março de 2014
Serra dos Candeeiros
a oeste
da minha infância
nada de novo
vislumbrar
as estrelas
pelas chaminés
das grutas
e o céu
do tamanho
de um homem
onde
gota a gota
se vão formando
jardins
de grandes falos
de calcário
e do amor paciente
pelas gargantas
e penhascos
gorjeios pueris
e risos falsos
tronitruantes
e alegrias
e visões
ancestrais
estou preso
pendurado
na corda
do tempo
ao mundo
exterior
sem espelhos
deito-me
extasiado
sob a abóbada
de fantasmagóricas
sombras
e enigmáticas
fosforências
ilusões
acordam-me
nas entranhas
da serra
criaturas fantásticas
e me deixam
em transe
num inominável
estupor
estou de volta
à infância
viagem de regresso
ao centro da terra
e do mundo
Lisboa, 9 de Março de 2014
Carlos Vieira
sábado, 8 de março de 2014
Mulher de palavra
Mulher
vou garatujar
uma palavra
inventada
e tactuá-la
em ti.
Sentir-me-ei
a beijar
tua pele
inspirando
o perfume
da tinta
no papel.
Se um dia
por acaso
te perder
serás
sempre
a mulher
da minha
única
palavra.
Lisboa, 8 de Fevereiro de 2014
Carlos Vieira
Flash VII
Inclina-se
sobre o bebedouro
de mármore
e o repuxo
de água fresca
é uma flor que emerge
que lhe sacia
a sede
da infância
e lhe seca as lágrimas
de hoje.
Lisboa, 8 de Março de 2014
Carlos Vieira
O desencontro
Chegou à porta da sua casa no beco sem saída, o seu coração bateu desesperadamente, esperando que não fosse tarde, irremediávelmente tarde. A noite estava escura como breu ponteada, por uma ou outra luz acesa nas casas.
Veio a voar com várias hipóteses de acidente, por milímetros e infrações graves pelo caminho. Na sua cabeça, só havia espaço para o ruído crescente, ensurdecedor, das suas últimas palavras. Esperando que as mesmas, não tivessem sido as últimas.
Nem reparou que um vizinho, olhava inquieto, umas vezes para si e depois para a janela do primeiro andar, onde um profundo silêncio e vazio reinava. Não era um bom sinal, ali existiam meia dúzia de casas e de carros, pelo que ela já reconhecia o ruído do seu, um agonizante Golf, de dez anos de maus tratos.
De modo que quando saía da viatura, logo se deparava com aquela confluência feliz do sorriso dos lábios e do olhar a pairar, por cima da floreira e a mão dela tão delicada, a afastar a cortina de renda branca, que coava a luz e elegia a sua esbelta silhueta.
Não foi o que hoje aconteceu, pelo que agora aguardava ansiosamente, que ela lhe abrisse o trinco que conhecia, ao cimo das escadas. Arrombaría a porta, se dentro de poucos minutos não houvesse resposta do outro lado.
" -Não aguento mais! Vou cometer uma loucura!"
Foram as suas últimas palavras ao telefone, as mesmas contrastavam com a aparente serenidade do seu último encontro. Sendo certo que o trabalho do escritório não lhe tenha permitido nos últimos dias acompanhá-la como devia, nada fazia prever, o dramatismo com sabor a ultimato daquelas palavras, não só para si mas tambêm para ela.
Já se preparava para ganhar balanço e deitar a porta abaixo, quando o vulto de um homem de alguma idade, envolto na sombra um pouco familiar, lhe perguntou com acento vagamente ameaçador.
"-O que é que o senhor quer? Não acha que não são horas de incomodar as pessoas?"
Perplexo, acenou algo que se podia confundir com uma desculpa, meteu o rabo entre as pernas e deu meia volta. Na sua cabeça zuniam inúmeras interrogações, abismos, silêncios inexplicáveis, o implacável avanço do vazio, da perda, do futuro da ausência e da perda de sentido.
Chegou a casa, não sabia por onde passou, guiou como um autómato, teve uma estranha dificuldade em estacionar. Retirou do bolso o molho de chaves, não reconhecia qual delas era a do seu apartamento.
Abriu a porta e foi só devido àquele inesperado caos que se instalou no seu coração e cabeça
que não se deu conta, de que um perfume pairava no hall de entrada.
Subitamente, sentiu os braços daquela mulher que julgava perdida em seu redor e suas pernas em tenaz a impedirem-no de avançar, de partir.
"- O meu pai apareceu lá em casa e vai ficar uns dias. Não conseguia estar mais tempo sem te ver, meu amor!"
Lisboa, 8 de Março de 2014
Carlos Vieira
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