A casa soergue-se agitada
em pânico abandona a rua
abandona-me na rua.
Eu desperto tardiamente
no meio do nada
e de dentro de um poço
olho para o céu que derrama
o seu vómito azul inconsequente.
As nuvens são animais ferozes
com dentes de chuva
um bando de gente volúvel
e de luzes trémulas
todos os animais enlouquecem
à sua volta.
Só confio neste lugar
de onde puxo a paisagem pela janela
com uma corda
fica um pouco apertada
nas minhas duas assoalhadas.
A corrente de ar faz bater
a porta da cozinha
no entanto sinto-me sufocar
perante a imobilidade do mundo
e o beco sem saída das ideias.
Todos os objectos me fogem das mãos
como os cães
que me roubam a comida.
Neste delírio tremens
assisto ao desabar
de tudo o que acreditava.
Ouço a campainha
afinal alguém me encontrou
neste manicómio
simulacro da eternidade
afinal sempre vão executar
a ação de despejo.
afinal sempre vão executar
a ação de despejo.
Lisboa, 11 de Novembro de 2012
Carlos Vieira
Jean-François Dupuis, “Delirium”