Mais de vinte e quatro horas sem dormir
e tenho barcos e sonhos com as hélices presas
nos cabos do desespero
ao mesmo tempo que as cegonhas atravessam
a cidade oblíqua
e no bico transportam o musgo
de reconstruir a ternura
entretanto no labirinto dos canais e das marés
vai a liberdade ficando assoreada
e deixo-me ir na corrente
nessa resistência inútil das algas
irrompe em verde água e ironia
sobre a madrugada da ria
e o desperdício azul do sono
o progressivo declínio da esperança
as gaivotas estremunhadas
voltam ao seu ofício de devorar os barcos
cada vez menos durmo
e nessa vigília
cada vez é mais difícil reconhecer as palavras
onde respiram os homens.
Lisboa, 3 de Abril de 2012
Carlos Vieira
“São Jerónimo” de Leonardo da Vinci
Sem comentários:
Enviar um comentário