sexta-feira, 2 de maio de 2014

Foi julgado...

Foi julgado 
à revelia
e condenado,
na vida haverá
sempre um dia,
em que perdemos
por falta de comparência!

Lisboa, 2 de Maio de 2014

Carlos Vieira

Às voltas com um "casburro"



eis ali
um belo
burro

tão belo
e tão burro

quanto mais
burro
mais belo

ei-lo ali
para ser
apenas
burro

mais vale ser
do que parecer
é belo ser
como é burro
o não ser

"todo o burro
come palha
é preciso
saber
dar-lhe
de comer"

de tão belo
fico burro
com tudo
isto

Lisboa, 2 de Maio de 2014
Carlos Vieira

                                                        Imagem de autor desconhecido

Café a solo



A sua mão
na chávena de café
de porcelana
a outra mexe
o açúcar mascavado
não existe um pingo
de misericórdia
para o derramado
olhar da sua solidão
bebe todo
o veneno de um trago
e vai-se embora
sem pestanejar
ficou apenas
a pairar
uma ausência
de lâminas
no seu lugar.

Lisboa, 2 de Maio de 2014
Carlos Vieira





                                                        “Automat” de Edward Hooper

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Segredo com Mona Lisa



Vigio-lhe
o dealbar do teu sorriso
tão fulgurante
porém 
não o posso revelar
pois se o fizer
irá de certo desvanecer-se
nos teus lábios
apenas 
meus lábios sabem 
daquilo que aflora 
no teu sorriso
o nosso segredo
e a concupiscência
do teu olhar.

Lisboa, 1 de Abril de 2014


Carlos Vieira


Assobio


há quanto tempo
não ouço um assobio
coisas dos campos
em que saber assobiar
era algo de rapazes
sem desafinar
com aquele timbre
aquele código de pássaro
de brincadeira
ritual de emoção
era algo de se invejar
hoje o assobio
é uma ave de extinção
ou quanto muito
assédio sexual.

Lisboa, 1 de Maio de 2014
Carlos Vieira

Tomo-lhe o pulso...

tomo-lhe 
o frágil pulso
e nesse acto singelo
sinto bater 
selvagem coração 
não sei se o meu 
se o teu
e nem tenho o curso
de primeiros socorros

Lisboa, 1 de Maio de 2014
Carlos Vieira

Revelações



No fim
de quase tudo
ela disse-lhe
para a ajudar
a puxar
o fecho do vestido
e nesse gesto
ascendente
do crepúsculo
da pele
ficou atordoado
o seu olhar
encontrou-se
naquela curva
deslumbrante
do seu pescoço
ali mesmo
por debaixo
do seu cabelo
apanhado
o perfume
a invadir-lhe
as narinas
quase ia jurar
que se vão fechar
os olhos dela
e o fecho do vestido
vai rebentar
e deles irá eclodir
o desfecho
de um novo mundo.

Lisboa, 1 de Maio de 2014
Carlos Vieira