terça-feira, 13 de março de 2012

III – Memória de Árvores (Oliveiras)


Nuvens de espanto dormindo sobre a fraga

 cabeleiras de aguarela verde

 manchadas de tordos

 de azeitonas

 e de sonhos

 transidos de líquenes

e de musgo

 neles corre o divino óleo

que o homem destilou

 do labirinto do tempo

 onde perdidos andámos

de candeia acesa

que arde no espesso sangue dos avós

e tece o fio de luz

 que iluminará o sabor da noite

 ou a deslumbrante serenidade dos peixe

 no abismo da vida

 e na textura e relento das palavras

que por vezes habitam a minha boca

 invocando a verdade e a paz

 e o fio de azeite

que caminha por cima das águas

levantando nuvens de espanto

 ou quanto muito

 frágeis flores de oliveira

 num silêncio rouco

 que nos cresce na fraga do peito



Lisboa, 13 de Março de 2012

 Carlos Vieira

                                                                 "Olive tree" Melissa Imossi

segunda-feira, 12 de março de 2012

lisa gerrard - persian love song

II - Memória de Árvores (Eucalipto)


Sede vertical sem fim e sem sombra de pássaros
árvore que cresce por dentro da febre e do papel
e sobre as tuas mãos se escreve toda a fresca seiva
na testa lisa do teu tronco esguio arde verde a utopia  
no quarto do menino enfermo exulta o teu perfume
elevas bem alto o grito interior que precede o poema
se à tua volta  a terra é árida é para que na tua escrita
se ergam as raízes de um desmedido amor e de revolta

Lisboa, 12 de Março de 2012
Carlos Vieira

                                               “Flaming Eucalyptsus” por  Eyvind Earle

domingo, 11 de março de 2012

OS CINES SELVAGENS DE COOLE - W. B. Yeats

William



OS CINES SELVAGENS DE COOLE

Em sua outonal beleza estão as árvores,
Secas as veredas do bosque;
No crepúsculo de Outubro as águas
Reflectem um céu tranquilo;
Nessas transbordantes águas sobre as pedras
Banham-se cinquenta e nove cisnes.

Dezenove outonos se passaram desde que
Os contei pela primeira vez;
E, enquanto o fazia, vi
Que de repente todos se erguiam
E em largos círculos quebrados revolteavam
As clamorosas asas.

Contemplei esses seres resplandecentes,
E agora há uma ferida no meu coração.
Tudo mudou desde o dia em que ouvindo ao crepúsculo,
Pela primeira vez nesta costa,
A alta música dessas asas sobre a minha cabeça,
Com mais ligeiro passo caminhei.

Infatigáveis, amante com amante,
Movem-se nas frias
E fraternas correntes ou elevam-se nos ares;
Os seus corações não envelheceram;
Paixão ou conquista solicitam ainda
Seu incerto viajar.
Mas vagueiam agora pelas quietas águas,
Misteriosos, belos;
Entre que juncos edificarão sua morada,
Junto a que lago, junto a que charco,
Deliciarão o olhar do homem quando um dia eu despertar
E descobrir que voando se foram?
W.B. YEATS

NATHALIE PICOULET

James Blake - Limit To Your Love

How little we know