domingo, 3 de abril de 2016
O frio...
“O frio é a porta do desaparecimento, a proximidade do não-ser”, diz o poeta e ensaísta Antonio Gamoneda, autor de Líbro del Frío (1992) e uma das vozes mais poderosas e singulares da poesia espanhola.
A vida medicamente assistida de poesia
As gotas
de soro
desciam
pela pequena
mangueira
transparente
e entravam-lhe
pela agulha
no antebraço
ele teve
um sorriso raro
e de seguida
um esgar de dor
no rosto esquálido
e implorou
à suave enfermeira:
de soro
desciam
pela pequena
mangueira
transparente
e entravam-lhe
pela agulha
no antebraço
ele teve
um sorriso raro
e de seguida
um esgar de dor
no rosto esquálido
e implorou
à suave enfermeira:
" - Se não se importa
misture-lhe a poesia
da eternidade,
preciso apenas
de um pouco de descanso!"
misture-lhe a poesia
da eternidade,
preciso apenas
de um pouco de descanso!"
Lisboa, 3 de Abril de 2016
Carlos Vieira
Carlos Vieira
Texto de gente acossada
Viver acossado, em quotidiana guerra civil, sem saber para onde fugir ou optando por um sinistro desconhecido, sem casa, sem escola, sem saúde, é algo estranho, exótico, para este nosso mundo, não nos diz respeito, faz parte de outra humanidade!
Nós somente vivemos acossados pelo último grito da moda, pelo peso e pelas dietas, por consumo, pela cilindrada, por prestações, pelo elevador social, pela difícil escolha do destino de férias, pelas escapadelas,pela insegurança, pelas intempéries, vivemos a vida que outros nos vendem e estoiramos o cabedal, tal é conforme a nossa humanidade!
Que raio de bichos somos nós e qual deles nos mordeu?
Que estranho estão a bater-me á porta. Qual dos representantes da humanidades um dia nos pode bater á porta, sim porque nós não temos nada a haver com esses mundos.
Lisboa, 3 de Abril de 2016
Carlos Vieira
Balada da Neve
Batem leve, levemente,
como quem chama por mim.
Será gente?
Gente não é, certamente
e a chuva não bate assim
Augusto Gil
sábado, 2 de abril de 2016
Tenho uma profunda...
tenho
uma profunda
e contraditória atração
por tudo o que é ténue
pela precariedade
lá chegará o tempo
da tirania da eternidade
uma profunda
e contraditória atração
por tudo o que é ténue
pela precariedade
lá chegará o tempo
da tirania da eternidade
Lisboa, 21 de março de 2016
Carlos Vieira
Carlos Vieira
a vida...
a vida
é essa artimanha
paciente que o tempo
nos demorou
a urdir
é essa artimanha
paciente que o tempo
nos demorou
a urdir
Lisboa, 2 de Abril de 2016
Carlos Vieira
Carlos Vieira
Na praia da Nazaré ninguém pode ficar de pé
Salpicos de espuma
na contenção
do seu rosto
o rumor de sal e iodo
deflagram
um fulgor de ignição
no desgosto
e na sétima vaga
na zona de rebentação
talvez lhe traga
mais que da alegria
breve o fruto
da aceitação
ou se conjugue
o amor
em turbilhão
e talvez o mar
dela se condoa
e a leve a ela
e ao luto
e à impossível
solidão.
na contenção
do seu rosto
o rumor de sal e iodo
deflagram
um fulgor de ignição
no desgosto
e na sétima vaga
na zona de rebentação
talvez lhe traga
mais que da alegria
breve o fruto
da aceitação
ou se conjugue
o amor
em turbilhão
e talvez o mar
dela se condoa
e a leve a ela
e ao luto
e à impossível
solidão.
L'hotel
L’hotel
Ma chambre a la forme d’une cage,
Le soleil passe son bras par la fenêtre.
Mais moi qui veux fumer pour faire des mirages,
J’allume au feu du jour ma cigarette,
Je ne veux pas travailler — je veux fumer.
Guillaume Apollinaire
Ma chambre a la forme d’une cage,
Le soleil passe son bras par la fenêtre.
Mais moi qui veux fumer pour faire des mirages,
J’allume au feu du jour ma cigarette,
Je ne veux pas travailler — je veux fumer.
Guillaume Apollinaire
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