Falta-me o golpe de asa
e sobra-me
o que uns apelidam
de decência
outros a consciência dos limites
não tenho ataques de pânico
por enquanto
apenas ataques de asma
e essa claustrofobia dos novos tempos
das contas, das rotinas e das missões
e de alguma poesia.
Aproveito por vezes as correntes
das altas para as baixas pressões dos sonhos
e a vertigem dos gestos
a frontalidade das almas desbocadas
mas logo a temperatura do sol
a inacreditável solidão nos olhos das crianças
e a lâmina do frio e da fome
nos temperam a trajetória
e nos apressam a queda
Ícaros devolvidos à Terra
sem sonhos
e sem asas.
Lisboa, 6 de Março de 2015
Carlos Vieira
A Queda de Ícaro de H. Matisse