segunda-feira, 18 de agosto de 2014

entre mim e o céu...

entre mim e o céu
um poema é pérgula
por onde trepam as palavras

Lisboa, 18 de Agosto de 2014
Carlos Vieira


Perfumada imobilidade



Verifico da janela
que as flores e as árvores
assinaram um pacto de silêncio
no seu imperceptível movimento
tento identificar o que pertence
à inquietação dos pássaros
ao monólogo do vento
ou ao rumor dos insectos
em tudo isto
não há uma ideia
que se possa aproveitar
ou a emoção de um momento
apenas a verticalidade tranquila
só o que tem de ser
ali acolá destilam
variantes reflexos de cores
e de perfumes que exalam
e uma odisseia de clorofila.

Lisboa, 18 de Agosto de 2014
Carlos Vieira




“Field of Light” instalação de Bruce Munro, 

domingo, 17 de agosto de 2014

Em busca do poema inoxidável

Enquanto
o ferro está quente
é que se malha
se moldam o metal
de rija têmpera
e os homens
no poente
de torso arqueado
depois da forja
incandescente
da humanidade
das suas mãos
cintilam chispas
e estrelas
grades e ferraduras
espadas
que hão-de tutelar
sonhos de ferreiros
e metalúrgicos
arestas vivas
lâminas doces
pingos de solda
e limalhas
palavras inúteis
que se soltam
escorrem de um poema
que se quis perene
inoxidável
para os homens
divina oração.

Lisboa, 17 de Agosto de 2014
Carlos Vieira


Pintura de Vulcano forjando os raios de Zeus

sábado, 16 de agosto de 2014

Amo a névoa...

Amo a névoa que se despenha 
sobre as imagens do passado
tanto como repudio
esses momentos
onde me encontro
com tantas memórias
que nos fazem perder
no significado
dos detalhes

Lisboa, 15 de Julho de 2014

Carlos Vieira

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Fragmentos de memórias

Toda a manhã
aguardou a visita
da palavra
que iluminasse
o objecto
onde pudesse
descobrir
o esplendor
residual
que as cristas
papilares
das suas mãos
implantaram
e assim 
não seria difícil
reinventar
o seu perfume
no molde 
daquele corpo
triste
que ainda 
persiste
nos lençóis
imaculados
da memória.

Lisboa, 15 de Agisto de 2014
Carlos Vieira


Pintura de Claude Le Boul

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Lenda de um amor quase possível



O amor
era num castelo
e tinha duas torres verdes
como eram os seus anos
e os seus olhos
de dúvida e amor puro
D. Fuas tinha ido à caça
e eles beberam
a água da fonte dos desejos
saciaram-se
num primeiro beijo
depois
foi o milagre do amor
que se desvaneceu
o poço que secou
e com ele tantos desejos
o caçador furtivo foi salvo
com seu cavalo
no Sítio da Nazaré
ali aconteceu o espetáculo
da vida e morte
onde tudo os separou
e eles sem saberem
um do outro
surfaram
em precário equilíbrio
a grande onda
que um dia
os havia de cuspir
sem amor e sem vida
na grande terra firme
da solidão.

Porto de Mós, 11 de Agosto de 2014

Carlos Vieira


quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Nota Crespuscular

lá fora 
confirma-se 
o anunciado
aviso amarelo
no riso amarelo
do vento
cá por dentro 
prolongado
rima profundo
o descontentamento
um simulacro ressequido
em cada esquina
alguém que partia
entre dentes o gemido
de um mundo
em escombros 
na ruína
em fim de vida
ou apenas sombras
entediados espectros
de doutores
do desemprego
e que saem
do Mercado Sem Valoress
vergando os ombros
dos altos e baixos
no final de dia

Lisboa, 13 de Agosto de 2014
Carlos Vieira