terça-feira, 7 de janeiro de 2014

O valor e qualidade do amor

Portanto, o valor e qualidade do amor é decidido apenas pelo próprio amante. É por esta razão que muitos preferem amar a ser amados. Quase toda a gente quer ser o amante. E a verdade nua e crua é esta: no íntimo, o facto de ser amado é intolerável para muita gente. O amado teme e odeia o amante, e pela melhor das razões. O amante quer sempre mais intensamente ao seu amado, ainda que isso lhe cause somente dor.


Carson McCullers, A Balada do Café Triste

Morrer de Amor - Maria Teresa Horta

Maria Velho da Costa




‎Não duvides - meu amor ...


‎Não duvides - meu amor - o gato sabe-o.
Os gatos sabem-no sempre, mesmo que nunca ninguém lhes confesse o quanto doem os dias de amor mal temperado.
Acredita, eles sabem e, por isso, falam com a janela mais silenciosa da casa, deixam de alimentar a horas o corpo de pêlos tão ternos.
Os gatos sabem-no e são os únicos animais que sentem da mesma forma que nós, que amam pessoas com nomes mais ou menos possíveis.
E nós somos para os gatos - quando eles nos amam - o parapeito de onde podem observar em segurança os dias menos cinzentos do ano.
O amor não é inútil. Só os gatos o sabem.


David Teles Pereira

Um amor à chuva




Todo o dia
este dilúvio
e tu com paradeiro
desconhecido,
tu que és tão frágil.
Por onde andas
onde te abrigas?

Sobre a cidade
abate-se o temporal,
tu tão crédula
desprendida, 
tu descalça a passear
num lençol de água,
tão exposta
e imprevisível.
Porquê
esse teu riso
torrencial?

Surges
no pensamento,
na intempérie,
absolutamente
irrepreensível.
Surges
rompendo
entres as nuvens,
irradiante,
como um sol
inesperado
em dia de chuva.
Será tão intensa
a tua luz ou 
tão profunda 
a sua tristeza?

Esperar-te-á
à porta
inquieto,
para que possa 
abraçar
o teu corpo
ensopado,
saciar-se
no vapor
do seu aroma,
tão febril
e intemporal.
São gotas de chuva
um amor
que esmorece
ou apenas
tarda?


Lisboa, 7 de Janeiro de 2014
Carlos Vieira



“Rain Room” Instalação artística por  “Random International” no The Curve at the Barbican Center in London, England, on October 3, 2012

Um amor sem correspondência

Um amor sem correspondência

Rosa em botão
desabrocha
que quero 
despetalar-te.

Lambuzar-te
do mel 
que sonho
para os teus lábios.

Soletrar 
a vertigem da pele
torneando a orla
do sono no teu ombro.

Avivar o incêndio
no ângulo morto da nuca
desfiando a loura filigrana 
do teu cabelo.

Inventar
a inenarrável odisseia 
no compasso
das tuas mãos.

Ajoelhar-me
diante do alabastro 
das tuas pernas
longuíssimas.

Anunciar 
em delírio
o vértice húmido 
do teu sexo.

Daí avistar
o ponto de fuga
e errando fazer o cálculo
para toda a galáxia.

Preservar
a distância
de poder amar-te 
em segredo.

As tuas nádegas
reflectem a música
e a luminosidade
das dunas ao luar.

Vislumbro o apelo
dos teus seios intrépidos
assinalando o rumo 
indómito do teu dorso.

Quero acreditar 
na indescritível visão
que interpreto
nos teus olhos castanhos.

Atravessas serena 
as revoluções
que acontecem 
na praça da cidade.

Sei de cor 
as asas do teu nariz 
arquejante e feliz
e as essências do teu perfume.

Descrevo o pescoço alto 
e elegante
para onde convergem
os abraços.

Teu pescoço
ponte que testemunha
o ruir do amor
e é cúmplice dos mistérios.


No entanto passo por ti 
e tu nem dás por mim
como se fosses apenas e só
uma obra de arte.

Eu aqui estou 
amordaçado na timidez
a tentar chamar-te à razão
gritando por ti dentro de mim.

Se eu pudesse ressuscitar-te
se pudesses não ser
por instantes
a minha morte.

Se pudesse 
articular a metáfora de uma rosa
em botão que vença o dialecto 
da nossa estranha solidão.



Lisboa, 7 de Janeiro de 2014
Carlos Vieira



segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Los países nocturnos (Carlos Marzal)

A Manuel A. Benítez Reyes

Hay una geografía de la mente,
Hay paisajes nocturnos, igual que territorios
en donde un sol dichoso eterniza.
Hay países de sombra que regresan
en el maldito tren de largo recorrido
con parada en nosotros.
Hay un desierto de la inteligencia,
y he navegado océanos sin luz
al fondo de unos ojos
que no tenían fondo.

No es una nueva dimensión del mundo.
El primer hombre ya exploró la tierra
en su vastedad negra; le bastó un instante
de auténtico dolor, para haber fatigado
los trenes, los desiertos, las selvas y los ojos.

Estas desordenadas palabras en la niebla
no pretenden servir, ahora ni nunca,
de acta fundacional de ninguna ciudad.
Estas ciudades han sido desde siempre
y viven en el alma,
alzadas en un aire enrarecido,
callejón neblinoso por donde ya anduvimos,
extrarradio feroz al que nos condenaron.

Explorador sin suerte,
viajero del mundo que has perdido
el Sur y el Norte, y el avión de regreso
hacia una patria un poco más amable.
Hermano equivocado que estuviste
el día equivocado
en el equivocado centro de tu vida,
equivocando el modo de escaparte.

Hay una geografía de la mente.
Hay un teatro donde se representa
nuestro viaje hacia nosotros,
desde nosotros mismos.
Y en la escena final del acto último
hay un barco que se hunde en un hielo brumoso,
mientras en los salones
una orquesta fantasma
acomete un vals para los muertos.

Adivina quién fue invitado a los salones,
adivina quién baila la música fantasma,
y adivina quién
se hundió con ese barco.

Lee todo en: Los países nocturnos - Poemas de Carlos Marzal http://www.poemas-del-alma.com/carlos-marzal-los-paises-nocturnos.htm#ixzz2peLvEUtF