segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013
Caracol põe os “corninhos” ao sol
Caracol põe os “corninhos” ao sol
constróis de clorofila
e da nervura da flor a casa que carregas
atravessas devagar
o perfume de orégãos
o clamor das rãs e o rumor da água
adormeces à margem
da catarata e do pântano do tempo
percorres nesse silêncio de prata
a distância que sabes subtil
que separa a terra da lua
que te esconde
resistes no interstício do tronco
na invencível solidão da fraga
no vertical exercício
teces á tua volta o poema
que vai de encontro ao mundo
que te esmaga
caracol põe os “corninhos” ao sol
Lisboa, 11 de Fevereiro de 2013
Carlos Vieira
domingo, 10 de fevereiro de 2013
Hoje fui a um funeral...
Hoje fui a um funeral
onde reencontrei como é natural
aquelas pessoas que ainda não morreram
aquelas pessoas que por circunstâncias da vida
estavam para mim um pouco mortas
esquecidas ou apenas de vez em quando lembradas
como outras pessoas entretanto ou há muito já mortas
o que cada vez mais acontece
é que cada vez vou a mais funerais e a velórios
onde nos vamos pondo cada vez mais à vontade com a morte
sem a enfrentarmos verdadeiramente
e de tanto a vencermos durante a vida nunca lhe damos
grande valor
mesmo quando a nossa vida já é pouco mais
que uma morte adiada
ou uma morte vivida
hoje fui ao funeral da minha prima Conceição
que na sua humilde medida soube ajudar-me durante anos
a que a minha existência à altura curta
naquele tempo de cinzas
fosse também de entrega
à ternura do seu gesto e da palavra
de muito mais vidas vividas
e pequenas mortes vencidas.
Lisboa, 10 de Fevereiro de 2013
Carlos Vieira
sábado, 9 de fevereiro de 2013
Ossos Ilíacos
Desconheço a razão, porque hoje acordei com estes ossos
atravessados no pensamento, como se fossem ilhas que emergem, reminiscências de
paisagens mediterrânicas.
Os Ilíacos não são muito conhecidos, excepto certamente nos pesados
manuais da anatomia, no surrealismo desinfectado das urgências dos hospitais,
nas salas de diagnóstico e de rastreio dos traumatizados dos acidentes de
viação e de outros episódios, que na vida moderna nos deixam literalmente
esmagados, onde nem os ossos mais desconhecidos ficam ilesos.
Fui pois, em busca dos Ilíacos. Verifiquei que os mesmos são
possuidores de asas como tantos pássaros, só que estes pairam ali na zona da
bacia e voam por ali, naquela tão sensível zona do corpo humano, tendo por
missão a protecção da zona pélvica e sendo um dos mais relevantes suportes, da
nossa erecta existência.
Até aqui nada de extraordinário, que uns desconhecidos ossos
tenham mais relevância que aquela que outros ostentam ou reivindicam, é algo
que os nossos pobres esqueletos, ao longo da sua vida, vão acompanhando com a
indiferença ou a resignação daquilo que se designa serem “ossos do ofício”.
Nesta exploração matutina pelas mais duras partes baixas da
humana compleição óssea, fiquei contudo a saber que os tais ossos, Ílio, Ísquio
e a Púbis eram acompanhados pelo Cóccix e Sacro, o que diga-se de passagem são
companhia de respeito.
Ossos que já me deixaram sem palavras e quase me fizeram
perder a respiração, pois quando atingidos, deixam-nos particularmente
disponíveis, para negociar aquilo que até aí achávamos absoluto, indiscutível e
passando a reconhecer como muito razoável, aquilo que até aí, era para nós do
domínio das mitologias.
Sentado sobre o assunto, fui escalpelizando os Ilíacos e
trazendo-os para a luz do dia, como se num laboratório os visse por outro
ângulo, fazendo incidir sobre aqueles uma outra luz.
Abracei pois estas partes mais recônditas e menos conhecidas
da nossa estrutura, bebi todo o conhecimento que dali podia dispor, visando
ultrapassar tão injusto esquecimento.
Senti necessidade de me espreguiçar e foi então que senti de
novo aquela dor aguda, me apunhalou “as minhas cruzes”, deixando-me de joelhos,
abominando os meandros enciclopédicos, que me haviam despertado outra vez esta recente
e ilíaca fragilidade.
Lisboa, 9 de Fevereiro de 2013
Carlos Vieira
terça-feira, 5 de fevereiro de 2013
Do amor efémero e da coragem
ser bravo
neste tempo manso
ter a coragem de ser breve
ser trevo breve
e a sorte de rever-te
na última vez do campo imenso
ser bravo
mesmo se não vence
ser a trova no teu corpo sulco intenso
seres demais em tudo aquilo que faço
mesmo quando
em ti não penso
ser o criador do espaço
e empunhar a lâmina
de uma distância que em ti não venço
ser quem sabe
o que criou para ti o laço
e na tua mão um esquecido lenço
ter de ser tão bravo e breve
nesse imenso
abraço da tua sede
ser também o vento
que te leve
e que invento para te trazer de volta
não ser nada sem ti
ponta solta ou quase nada
é tudo o que me resta
ser o perfume
da tua ausência e da tua festa
na madrugada
ser o lume
e a paixão fugaz
e inocência reencontrada
ser o diabo que te carregue
e a mim
que me não deixe atrás.
Lisboa, 5 de Fevereiro de 2013
Carlos Vieira
domingo, 3 de fevereiro de 2013
4R - Quarta República: "Some Common Mistakes"
4R - Quarta República: "Some Common Mistakes": Assisti ontem a algumas das intervenções realizadas na Conferência “Para uma reforma abrangente da organização e gestão do sector público”....
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