Não importa a existência
de um único plátano na minha rua
aliás não tem qualquer relevância
apenas perdia
e isso não se pode considerar pouco
um acordeão de vento.
Sei dele no outono
das folhas vermelhas
que me acenam
que se vão embora
há árvores que somente
fazem sentido
em algumas estações
noutras eram dispensáveis.
Sei dele também
que está etiquetado para ser abatido
pelos serviços camarários
o que é pena
puro egoísmo
causa-me um certo transtorno
às minhas tardes livres.
Encosto-me a ele por vezes
e oiço-lhe bater um relógio bêbedo de seiva
ninguém dá valor às árvores
que abraçamos durante a vida
com quem fizemos amor
árvores poderosas
de inspiração e sombra fresca
Sei dele do plátano
pela penugem das bolas verdes
sob a relva ou penduradas
amáveis como pequenas nuvens
que amadurecem
habituei-me a admirá-la
e a considerar a sua opinião vegetal.
Por baixo havia um banco de jardim
de um verde desmaiado
ali se contracena sempre
o mesmo drama
de uma velha conhecida solidão
e das flores que emergiam dos seus olhos
era um banco com o freio nos dentes
e de raízes na terra
de quem vivia à sombra do plátano.
No plátano os pássaros eram fugazes
assombrações
uma bela manhã recortada por uma motosserra
e o plátano passou a ser
mais uma assombração.
Lisboa, 29 de Outubro de 2012
Carlos Vieira