segunda-feira, 28 de dezembro de 2015
Coleção
Reuni
para memória futura
meia dúzia de palavras
a palavra
jangada à deriva
no imenso e azul oceano
um pássaro exausto
sem sentido
no céu infinito
uma pegada breve
arrastada
nas dunas do deserto
o uivo selvagem
coração ferido
em trevas da floresta
a silhueta acossada
e a lâmina desembainhada
na esquina da noite
a chave
que liberta os corpos
da clausura do silêncio
aquele estâmpido
que algures
põe termo à solidão
uma língua de fogo
a devorar o mármore as igrejas
ávido de chuva
um insecto
que sobrevoa
a dança das searas
a ânfora submarina
que a suave memória dos lábios
ainda habita
o sino de bronze
zurzindo em vida
o eco da morte nas aldeias
a concha
caída numa praia sem regresso
e sem sossego
o botão
arrancado na urgência e na raiva
de um amor desesperado
a flor arrancada
e caída das mãos
do desencontro definitivo
a lâmpada
campânula de luz bruxuleante
que te cerca de insónia a ti e ao livro
o rosto cabisbaixo
em dias de arame farpado
e de angústia
por fim
um pião e um cordel
esquecidos no tempo do asfalto
a minha coleção
a aguardar a descoberta
de um jogo e de um sonho
espero agora
que a força centrífuga
da ilusão volte a girar.
Lisboa, 20 de Dezembro de 2015
Carlos Vieira
"Le dejeuner sur l'herbe, 77", de Ana Vieira
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