domingo, 20 de julho de 2014

O lento caracol



o lento caracol 
sobe a cana
é subtil o rasto
que desenha
no orvalho
e imperceptível
a folha 
que estremece
estandarte
rumor verde
por cima
das translúcidas
amoras
que aguardam
serenas
a clarividência
azeviche
dos melros
e o insaciável
esmalte
dos teus dentes
enquanto
o vagar
dos meus dedos
te enlouquece
depois da noite 
de espinhos
incandescentes
acenderem
teu corpo
tenso de alabastro
isso foi antes
agora
indiferente
ao desejo
que na madrugada
te fustiga
e te esgana
o lento caracol
desliza
sobe a cana.

Lisboa, 20 de Julho de 2014
Carlos Vieira
 



sábado, 19 de julho de 2014

Poema guindaste

 

Ponho o gancho
do guincho
no cume 
e rodo a manivela
ergo o bote
agora grande ave
no horizonte
onde a baleia
acena
a grande barbatana
que salpica
a vista do Pico
ali fico encalhado
em ti
sem vento
no meio do canal
a ensaiar
este guindaste
de palavras
de mudar
o que deve mudar
no mundo.

Lisboa, 19 de Julho de 2014


Carlos Vieira

quarta-feira, 16 de julho de 2014

Alguém toca a campainha...

alguém toca a campainha
insiste
hoje não estou 
para ninguém
hoje é um dia sem história
e sem água
o estranho que tocou à porta
vinha substituir
o contador

Lisboa, 16 de Julho de 2014


Carlos Vieira

No seu peito...

No seu peito 
fenece o canto
obscurece a razão
no Verão não há rio
a alegria entristece
o coração vazio
e em vez do saber 
da doçura
medra 
a pedra dura
do esquecimento.

Lisboa, 16 de Julho de 2014
Carlos Vieira



terça-feira, 15 de julho de 2014

Hoje comprei...

Hoje comprei 
um kg de cerejas
no supermercado
que de seguida comi
e de cima da cerejeira
da infância ouvi
meu avô
"- Rapaz vê lá, 
se não cais daí!

Lisboa, 15 de Julho de 2014
Carlos Vieira

um cão rafeiro...

um cão rafeiro
passa por mim indiferente
apresso o passo
não se lembre ele 
de me vir mijar 
nos sapatos

Lisboa, 15 de Julho de 2014
Carlos Vieira

A erva...

a erva 
à minha porta
cresce com a minha ausência

Lisboa, 15 de Julho de 2014
Carlos Vieira