Dormito
o avião “turbula"
uma criança traquina
um velhote
aqui ao meu lado
ressona
um casal atrás de mim
ronrona
a interjeição ríspida
do virar de pagina
do restolhar da folha
perante o leitor
embevecido
tira-me o sono
aquela passagem
a hospedeira
passarela
com dois três recados
guardados
aninhados debaixo
dos seus caracóis
louros falsos
depois de um inexplicável
frenesim
de nuvens
o comandante
anuncia-nos
em voz baixa
a grande altitude
a nossos pés
a certeza
do oceano
inaudível
uma vizinha
do lugar
da fila do meio
no seu olhar lúbrico
como que acena
ao seu lado
sem se dar conta
um homem de meia idade
no seu ângulo morto
que boceja
e cofia a um bigode
fora de moda
para o hirsuto
o avião continua
sem desfalecer
com a sua respiração
pujante
por vezes
parece ter hélices
outras vezes
guelras
agora passamos
ao lado de Goose Bay
eu escrevo
na planície gelada
do écran
cercada
por fragmentos
de gestos
entre a ternura
e o ameaçador
de murmúrios
e de pensamentos
e artimanhas
de desejos
domesticados
pelo mantenha
o cinto apertado
que tremeluz
a ordem
é a que resulta
da exiguidade
do espaço
em que nos respiramos
o mesmo destino
em que decantamos
movimentos subtis
mecânicos
fugazes reflexos
de humanidade
enquanto escrevo
tiro a língua
a uma criança
que olhou para trás
enquanto
neste Boeing 777-300
fomos pensados
para olhar para a frente
entretanto
ouvi a força do vácuo
da sanita
ao abrir-se a porta
do wc ali à frente
observo agora
de um lado o Deer Lake
e do outro a Terra Nova
neste cockpit
da solidão
de um poema
onde estupidamente
me entrego
onde navego
percorro
com o olhar
por debaixo do algodão
das nuvens a imensidão
da superfície
à espera da neve
um caribu
enfrenta a tempestade
e o tempo
com a exuberância
das suas hastes
agora em cada ano
que passa
qualquer distância
atravessada
ou qualquer nada
nos deixa contente
até que uma voz
me desperta
e estremeço
“Senhor, quer café ou chá!"
podia até ser
a voz melancólica
do animal.
o avião “turbula"
uma criança traquina
um velhote
aqui ao meu lado
ressona
um casal atrás de mim
ronrona
a interjeição ríspida
do virar de pagina
do restolhar da folha
perante o leitor
embevecido
tira-me o sono
aquela passagem
a hospedeira
passarela
com dois três recados
guardados
aninhados debaixo
dos seus caracóis
louros falsos
depois de um inexplicável
frenesim
de nuvens
o comandante
anuncia-nos
em voz baixa
a grande altitude
a nossos pés
a certeza
do oceano
inaudível
uma vizinha
do lugar
da fila do meio
no seu olhar lúbrico
como que acena
ao seu lado
sem se dar conta
um homem de meia idade
no seu ângulo morto
que boceja
e cofia a um bigode
fora de moda
para o hirsuto
o avião continua
sem desfalecer
com a sua respiração
pujante
por vezes
parece ter hélices
outras vezes
guelras
agora passamos
ao lado de Goose Bay
eu escrevo
na planície gelada
do écran
cercada
por fragmentos
de gestos
entre a ternura
e o ameaçador
de murmúrios
e de pensamentos
e artimanhas
de desejos
domesticados
pelo mantenha
o cinto apertado
que tremeluz
a ordem
é a que resulta
da exiguidade
do espaço
em que nos respiramos
o mesmo destino
em que decantamos
movimentos subtis
mecânicos
fugazes reflexos
de humanidade
enquanto escrevo
tiro a língua
a uma criança
que olhou para trás
enquanto
neste Boeing 777-300
fomos pensados
para olhar para a frente
entretanto
ouvi a força do vácuo
da sanita
ao abrir-se a porta
do wc ali à frente
observo agora
de um lado o Deer Lake
e do outro a Terra Nova
neste cockpit
da solidão
de um poema
onde estupidamente
me entrego
onde navego
percorro
com o olhar
por debaixo do algodão
das nuvens a imensidão
da superfície
à espera da neve
um caribu
enfrenta a tempestade
e o tempo
com a exuberância
das suas hastes
agora em cada ano
que passa
qualquer distância
atravessada
ou qualquer nada
nos deixa contente
até que uma voz
me desperta
e estremeço
“Senhor, quer café ou chá!"
podia até ser
a voz melancólica
do animal.
Halifax, 13 de Outubro de 2015
Carlos Vieira
Carlos Vieira