quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Esta claustrofobia...

esta claustrofobia
geométrica do betão
sem telhados nem chaminés
nem gatos
esta falta de altura 
e de chão
de um primeiro andar
Lisboa, 15 de Outubro de 2014
Carlos Vieira

a gaivota...

a gaivota
no cimo do semáforo
alivia o imperativo das cores
Lisboa, 15 de Outubro de 2014
Carlos Vieira

terça-feira, 14 de outubro de 2014

Embebi...

Embebi 
o pincel na lua
só depois 
consegui
teu corpo nu
contra o verde escuro
dos pinhais
onde descortinei
indícios
do voo das rolas.

Lisboa, 14 de Outubro de 2014
Carlos Vieira

sonhos de uma noite de inverno...

sonhos
de uma noite de inverno
e pão quente
à boca do forno

Lisboa, 14 de Outubro de 2014
Carlos Vieira

Clausura



e nua
e sem pecado
um ser frugal
perante o absurdo
e a intempérie
sem uma palavra
nem o mais pequeno gesto
apenas
um silêncio vegetal
à flor da pele
pálida
e aquela falta de ar
e de história
elementos comuns
que a acompanharam
em toda a sua vida
agora
está nas suas mãos
no seu instinto animal
e naquele seu olhar cego
de sofreguidão
e de pobreza
tudo o que ainda lhe resta
já que deixou
no prego
o coração ignaro.

Lisboa, 14 de Outubro de 2014
Carlos Vieira



"Seclusion" de Charles Wilmott

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

De fajã em fajã I



A correr 
fomos de uma fajã a outra
aos saltos pelo "calhau"
entre salpicos de espuma
um pé nas grandes
bolas de pedra
e o outro na Terra
nas narinas a maresia
em breve chegámos
ao céu
eu e o João Paulo.

Lisboa, 12 de Outubro de 2014
Carlos Vieira


Poça da Feijão do Ouvidor

Interlúdio com uma sereia


Sinto 

o desafio da presença 

do seu olhar

cristalino o fio

do seu canto em surdina

a incendiar

os lugares mais inacessíveis

da carne.



Teu olhar redondo 

concha esquecida

como um lago 

onde sonhava refrescar

os meus pés 

de onde se erguem as colunas

de alabastro

das tuas pernas

para adornarem

uma tarde de um Verão.




Mergulho

espero por ti

volto à superfície

sereia

que desapareces

do meu mundo

num pestanejar.



E agora

batem em mim

as vagas da ausência

e fica-me a corroer

o peito 

o teu coração de sal 

procuro-te

pelo periscópio 

e somente encontro

um crepúsculo de frio.



Desvaneces-te

no submarino silêncio 

volto à condição

de náufrago

que foi morrer na praia

de uma amor

que existiu apenas

naquelas subtilezas do olhar 

que se cruza agora

com o teu lugar do vazio

preenchido por o eco 

de um canto

que no acaso coincidiu

com a tua sede.



Lisboa, 13 de Outubro de 2014


Carlos Vieira