segunda-feira, 14 de julho de 2014

Hora da criação



A minha mãe 
tem quase oitenta anos
os ovos que me deu
estavam quentes
ainda há pouco 
os tinha tirado
debaixo da galinha
a minha mãe 
é um poema 
que sai da capoeira
com um pequeno coelho 
que entrega à neta
esta passa
as suas pequenas mãos 
pelo pêlo macio
enquanto o focinho
laborioso
rói a cenoura
aos meus olhos cintilantes
e da minha filha
tudo isto é magia
os ovos e o pequeno coelho
a ternura da minha mãe
há também quem lhe chame
poesia.

Lisboa, 14 de Julho de 2014
Carlos Vieira



domingo, 13 de julho de 2014

Ladram os cães...

ladram os cães
ao desafio
nas casas
do fim da aldeia
não descansam
enquanto 
a noite
não abocanhar
o intruso

Lisboa, 12 de Julho de 2014

Carlos Vieira

Ontem a minha vizinha...

ontem 
a minha vizinha
prendeu com uma mola de roupa
a lua cheia no estendal

Lisboa, 12 de Julho de 2014

Carlos Vieira

sábado, 12 de julho de 2014

Fui ao quintal...

fui ao quintal
não distingo
a neblina nocturna
do fumo do meu cigarro
um pássaro e um gato 
num jogo de sombras
ignoram
a minha presença
destacam 
essa irrelevância

Lisboa, 12 de Julho de 2014

Carlos Vieira

A pobreza desavergonhada II



Só tem a roupa
que traz vestida
um andrajoso farrapo
desfraldado estandarte
suave tecido
em que começa a viver
a morte
ainda bem que é Verão
e moda o rasgão 
está leve
só lhe dói a fome
não lhe pesa a carne
sempre sobra
alguma coisa
no caixote de lixo
mais perto de si.

Lisboa, 12 de Julho de 2014

Carlos Vieira

A desconhecida floresta dos corpos



A pequena farpa de escárnio incendeia a floresta
onde transgride a petulância dos duendes
a faúlha que surge das sombras onde te enredaste
numa solidão de espinhos e no riso trocista das amoras
cúmplices da articulada estratégia das aranhas
e quando te desenvencilhas do labirinto
o banho de luz da clareira enxagua-te o corpo
e a clarividência dos trilhos tolda-se
face à planeada exuberância dos odores
que gravitam à tua volta
nunca serei o mesmo depois que comunguei
o crepúsculo das alcateias e o rumor secular dos cedros
sempre  que agora te tocar ficarei bastante perturbado
pela tua distância e pela minha fragilidade
as florestas negras que atravessei correm-me nas veias
confundem-me perante os mistérios do amor
e os impropérios com que me excitas
e a sofreguidão que nos devora.

Lisboa, 12 de Julho de 2014

Carlos Vieira

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-Online Browsing-: Don Hong-Oai. Photography in the style of a tradit...: Don Hong-Oai was born in 1929 in the city of Guangzhou in the Guangdong Province of China. He is often described as a Chinese artist, but ...