segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

A rosa do mundo

 Quem sonhou que a beleza passa como um sonho?
Por estes lábios vermelhos, com todo o seu magoado orgulho,
Tão magoados que nem o prodígio os pode alcançar,
Tróia desvaneceu-se em alta chama fúnebre,
E morreram os filhos de Usna.

Nós passamos e passa o trabalho do mundo:
Entre humanas almas, que se agitam e quebram
Como as pálidas águas em seu fluxo invernal,
Sob as estrelas que passam, sob a espuma do céu,
Vive este solitário rosto.

Inclinai-vos, arcanjos, em vossa incerta morada:
Antes de vós, ou de qualquer palpitante coração,
Fatigado e gentil alguém esperava junto ao seu trono;
Ele fez do mundo um caminho de erva
Para os seus errantes pés.

Mulher vendaval

mulher vendaval

retomas 
lentamente
o folêgo
a distância 

compões 
o cabelo
em desalinho
solta-se a máscara

sobra 
a humidade 
do teu olhar
último vestígio

apenas eu
percebo
porque estremeces
e me arrepio

no teu corpo
que se distende
o suor frio
brusca
memória de aconchego 

decifro
na tua boca
fragmentos de palavras
pontes em ruínas 
interjeições

destroços 
encenação de um fim
mulher inacessível
a salvo 
do temporal

já te esqueceste
da festa
de mim
no entanto és tu tudo
o que me resta

Lisboa, 10 de Fevereiro de 2014
Carlos Vieira

Zbigniew Preisner -- Love at First Sight (English Subtitle)

domingo, 9 de fevereiro de 2014

Ciclo


O lençol de água



Um lençol de água
na Estrada da Luz
nuances de óleo e néon
maquilham
seu rosto 
que se acende e apaga
no esboço
fugaz da penumbra
da paragem
faltam dois minutos
para o 726
volta a agitar-se
de súbito
ficou completamente
molhada
um automóvel
que passou
sobre ela projectou
o lençol de água.

Lisboa, 9 de Fevereiro de 2014
Carlos Vieira

Tempestade...



tempestade
é o impacto nas estruturas
do teu olhar
na minha carne já fraca
é o tornado de fogo que se gerou
no veludo dos teus lábios
e que me levou a alma

Lisboa, 9 de Fevereiro de 2014


Carlos Vieira

Onde


 
 

Onde
tenho estado
onde estou
Para onde foi a minha vida
A vivida
A que está por viver
Se tivesse sido outra
Seria a mesma outra
Não tenho mais vida
Para além desta
Que me vive.

Glória Gervitz