terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Infinitude I



Olho-te
tu és apenas um ponto
no horizonte,
partiste quando se instalou
entre nós o silêncio,
agora esbate-se o nome
das coisas
perdido que estou
nesta terra de ninguém,
abandonado
ao turbilhão da perplexidade,
no teu inesperado
esquecimento,
que sejas então um ponto 
no ocaso,
onde principia
um novo mundo.

Lisboa, 28 de Janeiro de 2014

Carlos Vieira

Do Not Stand At My Grave And Weep


Do not stand at my grave and weep
I am not there. I do not sleep.
I am a thousand winds that blow.
I am the diamond glints on snow.
I am the sunlight on ripened grain.
I am the gentle autumn rain.
When you awaken in the morning's hush
I am the swift uplifting rush
Of quiet birds in circled flight.
I am the soft stars that shine at night.
Do not stand at my grave and cry;
I am not there. I did not die. 

starlings in winter


Ah, world, what lessons you prepare for us,
even in the leafless winter,
even in the ashy city.
I am thinking now
of grief, and of getting past it;
I feel my boots
trying to leave the ground,
I feel my heart
pumping hard. I want
to think again of dangerous and noble things.
I want to be light and frolicsome.
I want to be improbable beautiful and afraid of nothing,
as though I had wings.


Mary Oliver

A sabedoria e a loucura

"Segundo a definição dos estóicos, a sabedoria consiste em ter a razão por guia; a loucura, pelo contrário, consiste em obedecer às paixões; mas para que a vida dos homens não seja triste e aborrecida Júpiter deu-lhe mais paixão que razão."Erasmo de Roterdão, O Elogio da Loucura

Andei pelas bainhas...


Andei pela bainha dos dias
costurando paisagens
colhendo suspiros
sorrisos
palavras breves
frutos para trincar em horas azedas

corro hoje
despido pelos trilhos da tua pele
rindo muito
fazendo-te cócegas
soletrando afagos
e perdendo as mãos
no atalho das tuas mãos

in... Amo-te /poemas para gritar ao coração - JOÃO MANUEL RIBEIRO - Trinta por uma linha

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s de solidão

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Solidão é uma palavra obscena. É mesmo a única palavra irremediavelmente obscena de que já ouvi falar. Cheira a atropelos, pudor, colhões, e tenho medo. Medo – um homem pode dar por si  a cometer crimes sem grandeza. Assassinar, por exemplo. Princípios superlativamente adolescentes. Prefiro a decomposição da pele, uma taberna entre cabeços, o petróleo de candeeiros que projectem sombras imóveis, recantos, pequenos estrumes. E já agora, se me dão licença,  um frio de certo modo inculto a bater no vidro da janela, nos ossos, talvez nos ossos quando se acaba o dinheiro. Mas é humano, bárbaro e humano. Uma espécie de sinfonia entregue ao poder de cada qual, arrecadações da alma, mansas. E dardejante o círculo azul de um copo de aguardente, aguardente, imagine-se, a saltar dentro de si, a subir, a subir, e um homem a dizer, imortal: senta-te, copo. Bebe comigo. E ele senta-se e bebe. É remoto, quase no outro lado das trevas. Mas magnifico, oh, tão magnífico. E ainda há quem me fale de escritores, romances, e até de revoluções. Balelas. Quero uma nora que pare o mundo rente ao ao fogo do inferno. E a água detida, doente, de preferência afogada pela mão de Deus a arder. Nada de riscos. Eis do que falo. Precário, inviolado, entregue ao soalho.

Poesia em hora de ponta



O cidadão abriu
o vidro do carro
e atirou o poema
pela rua fora,
o vento levou-o,
os condutores
os piões, os polícias
de trânsito,
estavam indignados,
não se sabe
se pela ousadia,
falta de respeito,
se ignorando
tudo isso,
o lixo
que pode ser
ou era a poesia.

Lisboa, 28 de Janeiro de 2014

Carlos Vieira