sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Solidão


A solidão é como uma chuva. 
Ergue-se do mar ao encontro das noites; 
de planícies distantes e remotas 
sobe ao céu, que sempre a guarda. 
E do céu tomba sobre a cidade. 

Cai como chuva nas horas ambíguas, 
quando todas as vielas se voltam para a manhã 
e quando os corpos, que nada encontraram, 
desiludidos e tristes se separam; 
e quando aqueles que se odeiam 
têm de dormir juntos na mesma cama: 

então, a solidão vai com os rios... 

Rainer Maria Rilke, in "O Livro das Imagens" 
Tradução de Maria João Costa Pereira

Filmes de culto








                                                        O Casamento de Maria Braun

Books to the ceiling...


Em memória de um amor desconhecido




Sei que era uma tarde
de Inverno
e faltamos às aulas
e a areia estava molhada.
Ela roubou um livro da livraria,
ainda me lembro
como se fosse hoje,
era o Heliogábalo ou o Anarquista Coroado,
eu nem sequer fui cúmplice.
Ela fumou um “charro”,
eu não fumei.
Ela chegou o seu corpo nu
ao meu
 e eu fiquei capaz de todos os crimes.
A última coisa
que me recordo
numa memória enevoada,
era do livro de Artaud
a fazer de almofada
e os seus olhos estrelados
e a sua cabeleira em chamas,
ainda hoje
o seu nome ficou por ali
preso às rochas
ou na amabilidade da espuma.

Lisboa, 3 de Janeiro de 2014

Carlos Vieira

Os amantes sem dinheiro

Vem beber café comigo

prometo não largar a tua mão

quando fugirmos sem pagar a conta



Bruno Sousa Villar

Acesa solidão



ela ao chegar a casa não acendia à luz
para que o seu vizinho
de inflamada paixão
não a incomodasse
naquele dia
acendeu uma vela
e ao vislumbrar a auréola
do seu rosto iluminado
inadvertidamente
queimei os dedos num cigarro.

Lisboa, 3 de Janeiro de 2013

Carlos Vieira

Estrada início


pouco depois do autocarro
sair da gare, ela, no caderno
escuro, escrevia a lápis: dentro 
de dois dias, chegar será 
o meu modo de dizer
sim. (e sublinhou a palavra)

Bruno Béu