segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Sonho-te real, em lágrimas de mar


Sonho-te real, em lágrimas de mar,
refaço as mãos, tuas raízes verdes,
conto e reconto as horas que passámos.
Repiso os passos, rasgo a estrada branca,
renasço em cada gesto que fizemos,
beijo-te outra vez, ajoelhado...


Enquanto longos, dolorosos versos
nas veias vão doendo


Pedro Tamen

Ave haiku LXIX


Pássaros, pássaros, pássaros
devoram-lhe os olhos e Invadem-lhe os sonhos
Hitchcock é um corvo que passeia na falésia.

Lisboa, 30 de Dezembro de 2013
Carlos Vieira

Ave haiku LXVIII



O rei ceptico enviou um pombo-correio aos aliados
uma mensagem que poderia ser interceptada dizia:
"- Senão atacarmos à noite fá-lo-emos durante o dia!"

Lisboa, 30 de Dezembro de 2013
Carlos Vieira

Poema com motor fora de borda



Aqui vou eu, marinheiro de água doce com o motor fora de borda, pela ria fora, fintando pequenas ilhas e contornando os baixios, lobrigando as bóias e apalpando estrelas no acerto dos canais e da tábua das marés.
Depois, depois é o mar sem fim, sou o mesmo eu, dando-me ares de lobo do mar, o eu que é filho da terra firme e inexpugnável. Que teve sempre este navio da viagem das palavras a lavrar dentro de mim.

Lisboa, 30 de Dezembro de 2013
Carlos Vieira

domingo, 29 de dezembro de 2013

Húmus

(...)Carlos

Se me perguntam o que é a vida - não sei o que é a vida. Sei que me devora - sei que tenho ao pé de mim a morte.

Que faz de nós a vida? A vida gasta-nos, reduz-nos a linhas essenciaes. Habitua-nos a viver, e, quando estamos habituados a viver, suprime-nos.

(...)


Raul Brandão

diário


Se Deus quiser hei-de morrer
Com tudo feito e por fazer.


Raul de Carvalho, Duplo Olhar

a queda


Je suis tombée
amoreuse, foi o seu
primeiro encontro
com o chão.

Dessa vez partiu
em cacos o coração.
Os ossos só mais tarde,
um por um,
contra a terra.

C'est fou la vie,
essa derrocada
a que apenas resistem
memória e pássaro,
em voo picado.


Renata Correia Botelho, Grisu nº1