domingo, 1 de setembro de 2013

You In My September & Sad Angel ( L'Amant - The Lover )


História de Volcan Sem, um homem que chora



Reza a notícia vinda da marítima cidade de Trabzon, na Turquia que Volcan Sen, médio do Trabzonspor, se “desfez em lágrimas” no meio do relvado, quando a sua própria claque invetivaram e gozaram nos seus cânticos a sua mãe, recentemente morta.

De imediato consolado por companheiros e adversários, o jogador foi impotente para conter o pranto perante a multidão e abandonou o “terreno de jogo” aos 43 minutos. Foi um homem só no balneário que acalmou a emoção que o havia acometido.

Posteriormente, o presidente do seu clube, provável defensor de que cada partida de futebol deve ser a “mãe de todas batalhas”, designou de falta de profissionalismo aquele comportamento, considerou a sua atitude digna de uma criança e ali sentenciou que o jogador não tinha futuro no clube.

Um homem não chora, quanto fará os futebolistas, deuses do Olimpo da nossa contemporânea mitologia.

O futebolista deve engolir em seco, quando a sua mãe morta é blasfemada naquela arena dos novos tempos, onde tudo pode valer para a multidão ululante.

A bola continuou a rolar no “tapete verde”, um pouco mal tratada rezam as crónicas. O árbitro deu uns minutos de desconto face aquele incidente nas margens do Mar Negro, onde um Volcan em ebulição derramou as suas lágrimas.

Talvez no próximo jogo entre em campo o homem novo, seco, enxuto, o que já não chora, o que esquece a sua mãe e o que vai “comer a relva”, aquele a cujo nome, a mesma turba vai a reconhecer a glória efémera.

Lisboa, 1 de Setembro de 2013

Carlos Vieira


                                            Cantico de adeptos poe jogador a chorar

História de um ciclista sem qualquer moral



Uma bicicleta desperta
e vai rente às nuvens
a campainha estridente...
espanta todas as aves
nos sonhos adormecidas
numa pedalada enérgica
depressa atingirá o cume
vai franquear o silêncio
a razão e um fruto fresco
e inteiro na límpida manhã
após as mãos sujas do óleo
da corrente que saltou
da mudança que não entrou
recortado na lama e alumínio
dos raios da roda traseira
ergue-se o sol sumptuoso
sobre o selim do mundo
depois se tudo correr
como vem sendo habitual
vai ficar cravado nos dentes
desgastados da cremalheira
agora desces pela colina
com um pouco de sorte
a raposa dourada do outro dia
vai atravessar-lhe o pensamento
antes de cortar a meta triste
onde vai chegar isolado
onde ninguém o espera
chega extenuado
de regresso à vida.

Lisboa, 31 de Agosto de 2013
Carlos Vieira

                                                 “Dusk Shadows” _ Bycicle Art Painitng

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

História para o meu amigo golfinho

História para o meu amigo golfinho

O mundo
é a bola multicor
que avança
e se equilibra
que dança
no focinho
de um golfinho
que é animal
inteligente
e que dotado
se não fosse
pedir muito
meu amigo
podias agora
simplesmente
deixar de lado
as brincadeiras
deixar-me
no sossego
deste presente
inglório
já tenho a cabeça
à roda
daqui a pouco
tenho as tripas
de fora
e estou a chamar
o gregório
claro também
já aprendi a curvar
a espinha
depois a sardinha
mas nem sempre.

Lisboa, 27 de Agosto de 2013
Carlos Vieira

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Bailado para uma despedida



A trama
dos gestos desprendidos
o pretexto das tuas pernas
de tesoura
sobre a fragilidade
de um fio imperturbável
numa pirueta
podes ser a face
de uma solidão em pontas
o peso insustentável
de uma lágrima
traindo-te
no murmúrio dos teus lábios
trémulos na emboscada
onde sobrevives
a um silêncio ensurdecedor
puxas o gatilho da tua festa
fulminas
depois acorres
com teu sorriso acolhedor
na curva fechada do caminho
da tua mão agitada
que descreve o arco
onde estremece o corpo
ameaçado por um olhar
de soslaio
vai vai mulher do cabelo solto
que voa
voa despenteado
abre o ângulo morto
da tua dor calada
deixa que o insulto contido
incendeie a paisagem
e o esplendor do teu vulto
depois todo o estertor
do teu corpo
que seja o bailado
do lenço de seda que acena
no cais do mal entendido
aragem mínima
miragem
na minha sede
de querer que sejas mais
que um poema
que se afasta.

Lisboa, 27 de Agosto de 2013
Carlos Vieira


domingo, 25 de agosto de 2013

Entre o céu e a terra

                                 “Há mais mistérios entre o céu e a Terra do que supõe a nossa vã filosofia"
                                   William Shakespeare





Os seus lábios
dizem um crepúsculo
onde se adivinha
a fecundação
dos astros
em órbita
pelos bosques
a fragância da terra
na orla do sangue
o rumor animal.

O olhar é o arado
que sulca
o veneno ocre
da tua pele ávida
campo aberto
onde se ergue
um fulgor de pássaros
com raiz
no grávido silêncio
das sementes
no céu um deserto.
de anil.

Para a fuga
de todas as estrelas
existe o istmo
das tuas ancas
tudo resto é noite
inexplicável
convergência de amoras
um rumo lancinante
de espinhos
incandescentes.

Lisboa, 25 de Agosto de 2008

Carlos Vieira



                                                     Pintura de Marc Chagall

Charlotte Gainsbourg / L'un part l'autre reste