Tendo sido vetada pela autoridade competente
a entrada no país
corre agora dentro de si toda a sofreguidão do rio
em busca da raiz
das palavras
barcos que descem intrépidos até à foz
desfazendo nós
das palavras
temerosas da voracidade dos peixes e quedas de água
os remos afagam a mágoa
das palavras
que se afogam em formulários
preenchendo a sua vaga naturalidade
palavras ansiando
represas e a emoção da língua
vencem a bruma
as suas mãos de uma brancura fulgurante
sem palavras
reconheces o diálogo das pedras entre a espuma
que pode ser o teu país
em silêncio
porque as palavras podem ser usadas contra si
o fulgor de arestas do teu olhar
a soletrar
os contornos da ausência
da tua vida
à deriva
do teu corpo a divagar
sem pestanejar
sulcando-o um pequeno fio de sangue
visando
o passaporte para uma outra vida
outro país
definitivamente apátrida.
Lisboa, 20 de Janeiro de 2013
Carlos Vieira
Pintura de Alfredo Aquino