segunda-feira, 11 de junho de 2012

Amores de Verão VIII

 

Quase podia ouvir

os teus pequenos passos

estudados para o encontro

furtivos

por detrás das grandes rochas

do pensamento

antes da paixão

essa lâmina forjada na lua

perpendicular

o teu olhar libidinoso

a corroer-me por dentro

de um doce tormento

lembro-me depois de nós

de estarmos ali íntegros

nus e sós

sem mácula

os teus gritos

faziam parte da curva de água

no ruir das ondas

rastilho do esplendor

de todo o pecado

depois não ouvi mais nada

e fiquei cego

sei que não houve misericórdia

que algures aconteceu a nossa morte

e lembro-me de ter ressuscitado

ao teu lado

na coada madrugada

do céu riscado de uma barraca

no meu sonho não sei se dormias

profundamente

ou se tinhas partido

nunca mais deixei de te amar

nunca te poderia dizer

nunca te iria dizer

no medo de te perder

ao te acordar





Lisboa, 9 de Junho de 2012

Carlos Vieira


                                                         “Summerlove” Nathalie du Prel

Amores de Verão VI




Tudo aquilo

foi uma tragédia

morreu no entanto

como sempre desejou

nos braços da mulher amada

é certo que se esvaia

em sangue

foi seu último

e o mais belo Verão

ela  tinha os cabelos molhados

e não chorou uma única lágrima

já não o amava

ele só depois de morto percebeu

depois que ela já lhe tinha espetado

o punhal

cirurgicamente

no coração

com toda a ternura

fulminante

despojando-o de toda a dor

último gesto de amor

letal

era intolerável para ela

que o pudesse enganar

deu uns retoques na pintura

e no cabelo

e respirou

como se saboreasse a liberdade

desde há muitos anos

e entregou-se depois

às autoridades



Lisboa, 9 de Junho de 2012

Carlos Vieira

                                                                Andor Novak “Femme Fatal”

domingo, 10 de junho de 2012

João Paulo Esteves da Silva "Durme"

I Speak Alone

I Speak Alone by Gordorca

Amores de Verão IX


amei-te na forma breve

do amor eterno

nem os deuses sabem

o que fizemos nas dunas

todas as outras raparigas 

eram silêncio e cinzas

os gritos inquietos

das gaivotas brancas

pairavam

a minha boca percorria

em silêncio

a tua pele dourada

a areia escorria

na ampulheta das tuas mãos

o tempo parou



Lisboa, 9 de Junho de 2012

Carlos Vieira



Foto de autor desconhecido

Amores de Verão V


Eras aquela rapariga, um fogo-fátuo na esplanada, uma aurora boreal a incendiar os bosques dos olhares.
Lembro-me tão bem de todos os teus passos, dos teus pés descalços, a pisar o relvado, do teu gesto de ave a mergulhar no lago, isso refresca-me os sentidos, aviva-me a memória.
Dou umas braçadas rápidas até ti e abraço-te nas entrelinhas, nesse lugar de água límpida, nesse rumo de neblina de que são feitos os sonhos.
Lembro-me, como posso eu esquecer do nosso amor fulgurante, tu eras uma sereia de revista cor-de-rosa, eu, um herói com pés de barro. Hoje no princípio do Verão regressaste que bela é a surpresa que se solta dos teus dedos e renasce em mim.

Lisboa, 9 de Junho de 2012
Carlos Vieira


                                   “From Here To Eternity” Deborah Kerr e Burt Lancaster

nat birchall - going to the mountain