quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Adeus - Eugénio de Andrade

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Outra vez cantos de sereia

De ti
são inúmeros os sinais que vislumbro
por detrás
da efémera cortina do momento
em que espreitas
por uma janela de tempo
de tanto mar
e de tanto desassossego
contudo não encontro
a nua latitude do teu torso
e navego na esteira
do que nos guia e nos ilude
por vezes aquela luz lá longe
podem ser as labaredas do teu seio firme
ou o intrépido rasgar da tua carne
enunciando o fulgor dos pássaros
cúmplices
solto as amarras
e sigo-te por aquela rota
pois podes ser o silêncio aceso nas falésias
e ouvir a tua voz
é como exibires uma coroa de prata
e se despires a filigrana da espuma dos dias
vais devastar a mentira etérea
e o verdete da malícia
que nos cerca
e nos separa
se pudesse
apenas saborear de novo o calor e o sal
que libertas do teu corpo
só isso me iria permitir
fundear noutros horizontes
à sombra dos teus pensamentos
se pudesse usufruir dos aromas
que descem felinos
pela noite das árvores dos bosques
no teu território
se pudesse desfrutar
no jardim luxuriante um simulacro
dos teus inesperados abraços
e ir à flor da pele
sorver o elixir e o antídoto
dos frutos proibidos
se pudesse descobrir o meu rumo
se ele fosse necessário às tuas tréguas
nunca estaria perdido
nestes desencontrados sinais
de ti

Lisboa, 17 de Janeiro de 2012

Carlos Vieira







                          “Pequena sereia” em Copenhaga

Garden of Melancholy -The art of Mike Worrall

Desdeñosa - Lhasa de Sela

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Logaritmos


Sempre este secreto desejo do reencontro
na esquina um lugar
onde te reconheço

Esta insatisfação na altitude de um beijo
aritmética invulgar
quando amanheces

Inventas o caminho íngreme que me contas
vences um socalco
e esconde-se a raposa

Depois a luz que o ângulo do teu rosto revela
é só o fragmento do olhar
na clausura da tela

Por entre as copas das árvores espreita-me
o céu ou espreito-te eu
a ave que voa nada teme

O gesto parte contorna-te os lábios
fala por si  
e tanto havia para te dizer


Não sei se é teu o vulto que avisto
fraca é a vista
só de tocar-te fico cego

O belo alabastro dos teus ombros tão exacto
do perfume que inebria
e da confluência de afagos

Banhado pela fome ou luz triste que o despe
resiste o mistério do teu corpo
fogo eterno que me consome

Lisboa 15 de Janeiro de 2012

Carlos Vieira

“Naked Woman before Stove” por Felix Vallotton