O teu silêncio cúmplice
tem a profundidade das viagens dos grandes cetáceos
e dos sonhos dos grandes homens
Que nem sonham dos grandes perigos
que os cercam
O grande silêncio de te poder escutar
em todos os objetos da nossa pequena casa
que após o teu toque suave
respiram o amor das tuas mãos
todo o sono dos justos
e a insónia dos que sofrem em silêncio
desagua no grande rio das palavras caladas e por dizer
afluente do teu silêncio aflito
De mãe sem respostas aos estímulos
incrédula perante os sintomas
que sofre sozinha todas as ausências
e o silêncio ancestral das memórias
onde reencontro
envolto de grande mistério do teu corpo nu
debaixo da árvore
onde adormecendo regresso
e te reinvento numa breve alegria
iluminada de um frémito de folhas
e de pássaros
Reconstruo-te a partir do vazio dos amigos
que já partiram
e dos outros que nunca mais reencontrei
Dessa emoção silente e imaterial
farei o molde e os nós
de onde renascem e se desatam os abraços
e se vai quebrar o silêncio deste mesmo mundo
Neste mar bravo da vida
e grave silêncio dos antepassados
que deixámos de ouvir
daquele dos injustamente acusados
e dos que vão esboçando gestos
perante a surpreendente dificuldade das palavras
O teu silêncio meu amor é uma flor desabrochando
para os que vão partir
e também para os que estão a morrer
e cujas palavras
não vêem o sol de um último sorriso
Estar aqui
olhar para ti e por ti e está tudo dito
Minha imensa graça de um poema sem palavras
e em que todas as palavras encontram o seu lugar
o seu ritmo
Tu és meu desejado ermitério
e meu silêncio
e meu celebrado protesto
daqueles que não tem
nunca terão voz.
Tojal, 6 de Agosto de 2013
Carlos Vieira