sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Odeio...


Odeio 
estes versos taciturnos
a transbordar de estados de alma
prefiro aqueles que à cintura
do poema
apresentam o brilho cortante
das adagas.

Lisboa, 10 de Janeiro de 2014
Carlos Vieira

Viagens XVIII



Aqui vou eu
e a minha máscara
tão próximos e tão desconhecidos.

Lisboa, 9 de Janeiro de 2014

Carlos Vieira

“Última chamada!”

“Última chamada!”
Oiço um nome
que não consigo repetir,
talvez um dia,
Deus,
tenha dificuldades
insuperáveis
em proferir
o meu nome
e eu ficarei cá na terra,
eternamente.

Lisboa, 10 de Janeiro de 2014
Carlos Vieira



Do Titanic no écran

«A poesia é uma loucura de palavras»:

golfadas de água, pistons, caldeiras,

mar de silêncio, música de pianoforte,

escadaria, ascensores, golfadas

...de água, trajos de gala, icebergs,

mar de silêncio, amor, morse, foguetes

de luz, música de pianoforte, amor,

decotes, plumas, tules, icebergs,

pistons, camarotes, madeira envernizada,

tapeçarias, ascensores, morse, amor,

mar de silêncio, salva-vidas, escaleres,

escadas de corda, sino, apitos, foguetes

de luz, golfadas de água, escaleres, jorros,

mar de silêncio, morse, sino,

escaleres, amores mortos, morse,

morte, amor, morse – disse

um grande poeta meu contemporâneo.



Fiama Hasse Pais Brandão in Poemas com Cinema, pag. 78, Assírio & Alvim

Os direitos inalienáveis do leitor


Esta noite

Esta noite morri muitas vezes, à espera
de um sonho que viesse de repente
e às escuras dançasse com a minha alma
enquanto fosses tu a conduzir
o seu ritmo assombrado nas trevas do corpo,
toda a espiral das horas que se erguessem
no poço dos sentidos.


Fernando Pinto do Amaral

Não sei quantas almas tenho (fernando pessoa)


Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,
Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.
Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: “Fui eu?”
Deus sabe, porque o escreveu.