domingo, 5 de janeiro de 2014

Histórias com os meus botões I

Um dia quis-te de súbito nua 
arranquei um a um todos os teus botões
e fiz uma coleçâo.

Lisboa, 5 de Janeiro de 2014 


Carlos Vieira

Ave haiku LXXIII




Fiquei de sobreaviso
o espírito santo de orelha
foi o marulhar da ave entre as folhas.

Lisboa, 5 de Janeiro de 2014


Carlos Vieira

O trem da vida III

O trem da vida III

Dentro de si
a locomotiva 
dos irmâos Lumiére
esse jacto de luz
que iluminou
as salas e os túneis 
escuros
e todas as estações
da sua vida.

Nas suas veias
corre a linha do Tua
e o sangue do crime
do Expresso do Oriente
dentro do seu cérebro
um comboio apitou
três vezes.

Depois do Trem das Onze
desalmadamente 
o vento fustigava-o
mais a si
que ao casal de namorados
na estação da Parede.


Despertou
em pânico
com os estalidos metálicos
da mudança em Irun
para a bitola europeia.


À flor da pele
aquele Breve Encontro
onde decorre
todo o amor proibido
e todos na mesma carruagem
ele de olhar perdido
na paisagem
de tanto desencontro.


Por dentro
do seu corpo
nas entrelinhas
do seus ossos
zunem nos carris
as rodas das carruagens
que chegaram a 
todas as Austerlitz's
da história.



Lisboa, 5 de Janeiro de 2014

O trem da vida II



Ali vai 
no wagon-lit
deitado no beliche
a mulher dos seus sonhos
por baixo
e um qualquer deus
por cima
ou vice-versa.

Lisboa, 5 de Dezembro de 2014
Carlos Vieira

O trem da vida I



Na minha vida
houve sempre 
um comboio 
a passar
um suburbano
um pendular
e eu no cais 
à tua espera
sabendo já
que não vais
chegar,
outro a partir
tu na janela
a dizer adeus
ou afinal
não eras tu
foi mulher
que inventei
para o teu
lugar.

Lisboa, 5 de Janeiro de 2014

Carlos Vieira

sábado, 4 de janeiro de 2014

Hoje enquanto esperava

Hoje enquanto esperava 
que a chuva amainasse
escorria apenas água
na espada do Condestável
na Pastelaria Oliveira
comia o milésimo pastel de amêndoa
reparo agora 
muitos anos depois dali 
ter jogado à lerpa
que as Capelas 
para além de terem ficado Imperfeitas
há muitos séculos que chove 
lá dentro como na rua.


Lisboa, 4 de Janeiro de 2014


Carlos Vieira

O Lena voltou...

O Lena hoje voltou a ser 
ululando
o rio turvo da minha infância
revi o meu avô
junto à margem de galochas
e chapéu de chuva
debaixo de um salgueiro
a pescar enguias
com um gancho do cabelo
depois a transbordar
na memória imperfeita do vale 
o espelho de água
e o Castelo de Porto de Mós
a navegar.

Porto de Mós, 4 de Janeiro de 2014


Carlos Vieira