terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Do amor efémero e da coragem



ser bravo
neste tempo manso
ter a coragem de ser breve

ser trevo breve
e a sorte de rever-te
na última vez do campo imenso

ser bravo
mesmo se não vence
ser a trova no teu corpo sulco intenso

seres demais em tudo aquilo que faço
mesmo quando
em ti não penso

ser o criador do espaço
e empunhar a lâmina
de uma distância que em ti não venço

ser quem sabe
o que criou para ti o laço
e na tua mão um esquecido lenço

ter de ser tão bravo e breve
nesse imenso
abraço da tua sede

ser também o vento
que te leve
e que invento para te trazer de volta

não ser nada sem ti
ponta solta ou quase nada
é tudo o que me resta

ser o perfume
da tua ausência e da tua festa
na madrugada

ser o lume
e a paixão fugaz
e inocência reencontrada

ser o diabo que te carregue
e a mim
que me não deixe atrás.

Lisboa, 5 de Fevereiro de 2013
Carlos Vieira

 
 

sábado, 2 de fevereiro de 2013

Voo de treino para um dia cinzento


 

 

hélices

pétalas de metal

desfazendo o silêncio

de algodão

 

no céu

prossegue o diálogo

a duas vozes

do bimotor

um “vol de nuit”

 

deus permanece

calado

à escuta

no “cockpit”

 

o coração

em looping

oiço a música

o vórtice

entre as nuvens

do seu corpo

 

 

Lisboa, 2 de Fevereiro de 2013

Carlos Vieira

 

 

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Itinerário com laranjas, peixes e sol






                                                    

Hoje ia trabalhar
de entre a folhagem
sedutora
uma  última laranja
resistia
a espreitar.




                                               Textured red fish J. Vincent scarpace

Mais á frente
sabia de um peixe
da mesma cor
que faria piruetas
no lago verde
sem que alguém
 pudesse suspeitar.



                                                            

                                                         "Sun" de dandelion (in Tumblr)

O sol
ora se escondia
entre faias e ciprestes
ora se desfazia
em pássaros
tudo muito inocente .

Eu ia trabalhar
e não acredito
em coincidência
estou sem disposição
sem tempo
para este cerco
de sombras
onde começa o dia
de jogos de luz
e de cores.

Hoje decidi
que só é útil
à poesia
esta disposição
este tempo
de laranjas, de peixes
e de sol
se colhidos
por aqueles
que neste dia
não vão trabalhar.

Lisboa, 1 de Fevereiro de 2013
Carlos Vieira

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

A alguns pés de profundidade


Aqui permaneço
quase imóvel
desço
a direito
neste abismo
náufrago
deste cansaço
neste papel
de regresso
à máscara
em que de mim
me esqueço
neste mergulho
em apneia
no estupor
da superficialidade.

Lisboa, 31 de Janeiro de 2013
Carlos Vieira

    Imagem do Blog “iz’s Sketchblog”


quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Uma rapariga, a Vespa e um sonho


De cabelos castanhos
soltos
fulgentes
como se fosse um sonho
a vespa
soltou-se da floresta
e  atrás de si
trazia a madrugada
em azul metalizado
ou será
que tinha o cabelo
amarrado
a um lenço
a um sonho motorizado
que a seguir
se esfumou  na névoa
que se tinha
levantado?

Lisboa, 30 de Janeiro de 2013
Carlos Vieira

                                              Imagem de CayBroendum_com Illustrations